Prêmio Nobel, por Zé do Blogson

Descobri recentemente - na verdade, foi ele quem me descobriu - o blog Blogson Crusoe, de autoria de um declarado misantropo do qual só sei que se chama Zé, de Belo Horizonte.
No blog, o Zé registra lá seus pensamentos, suas elocubrações, seus insights, as suas sacadas, tudo em textos curtos, leves, claros, concisos, agradáveis de se ler, escritos em bom e correto português (coisa rara na net) e sempre muito inteligentes e espirituosos.
Mas não é que o Zé (nem sei se ele percebeu isso) está a se tornar um bom marretador? Em sua última postagem, Prêmio Nobel, ele marreta, (ainda) com marreta de pelica, a precariedade da educação pública. Eu, que sou do meio, não tenho única ressalva a fazer a seu texto, concordo com tudo e assino embaixo.
Parabéns pelo texto, pela clara visão da realidade.
Em tempo, Zé : fiquei comovido (e não estou zoando, não, gosto pra caralho do que você escreve) com sua ingenuidade ao perguntar ao seu filho se ele tinha visto limite e derivada no colégio. Limite, Zé, é algo com o qual o hediondo e mal-intencionado Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA (somos ou não somos o país da piada pronta?) acabou. Não há mais limites para os adolescentes nas escolas, nem limites comportamentais nem limites morais, e querias os limites da bela matemática? Derivadas, Zé? Essa molecada de hoje não conhece nem as "derivadas" do leite. Se te arriscasses, então, a perguntar pelas integrais (eu cheguei a ver integrais no colégio), verias que eles não suspeitam sequer da existência do arroz integral. 
São os novos tempos, Zé? Sim, são. É a modernidade? Sim, é. São os novos rumos do pensamento? Sim, são. Mas não significa que sejam bons. Não são. E muito menos significa que tenhamos que gostar deles. Não gostamos, Zé.

PRÊMIO NOBEL
Tudo começou por termos ido a um aniversário em um reduto petista, ou melhor, de eleitores da Dilma. Papo vai, papo vem, a certa altura, sem que eu me desse conta, estava envolvido em uma conversa sobre a qualidade do ensino praticado hoje em escolas públicas. Entre outras coisas, comentei que, tempos atrás, tive a sensação de que meus filhos estavam aprisionados pela escola (pública) em que estudavam, pois percebi que a perspectiva de vê-los passar no vestibular era muito pequena, tão baixa era a qualidade da educação por eles recebida. Esse colégio era literalmente (ou quase isso) uma zona! E eu não tinha dinheiro pra colocá-los em escola particular.

Contei também de meu diálogo com o diretor a respeito do “ensino plural”, maluquice ali adotada, que não reprovava ninguém. Esse diretor ficou sorrindo meio constrangido quando lhe disse que o colégio que dirigia estava em total sintonia com as conquistas proporcionadas pela evolução da informática e que era um exemplo de aplicação da realidade virtual. E antes que ele me perguntasse por que, expliquei que em seu colégio estava implantado o ensino virtual, pois os professores fingiam que ensinavam, os alunos fingiam que aprendiam e os pais fingiam que acreditavam nessa merda.

Contei de minha infância mega pobre e de como tinha conseguido o que temos hoje (que não é muito) graças a um ensino de alta qualidade que existiu em algumas escolas públicas, estando a minha nesse grupo. Comentei sobre a necessidade de meter a cara nos estudos para conseguir ter alguma coisa na vida.

Estava nessa “doutrinação” do bem, quando um adolescente que escutava nossa conversa, comentou que seu professor de filosofia teria colocado a seguinte questão para a classe: o que é mais importante, ter ou ser? Não vou reproduzir o que pensei que diria a esse professor se o encontrasse, porque este é um blog que se dá ao respeito. Mas fiquei surpreso, pois não sabia que hoje se ensina filosofia no segundo grau!

Aqui cabe uma pergunta: e matemática, português, biologia, história ainda são matérias da grade de ensino?  A propósito disso, perguntei uma vez a meu filho mais novo (que fez o primeiro e segundo graus só em escola pública) se ele tinha estudado limite e derivada no colégio. A resposta foi que nunca ouviu falar disso.

Pois bem, no dia seguinte a essa conversa desanimadora, comecei a pensar o que leva um país como este nosso a nunca ter ganho um prêmio Nobel em todo o período de existência dessa premiação. E aí mergulhei no site www.nobelprize.org para ver se achava alguma pista.

Descobri, por exemplo, que entre 1901 e 2014 os prêmios Nobel e de Ciências Econômicas foram concedidos 567 vezes para 889 pessoas e organizações. A curiosidade é que o prêmio de Economia, criado em 1968, não é considerado um Nobel legítimo, pois não faz parte da lista de premiações imaginadas por Alfred Nobel.

Para um portador de TOC como eu, as listas dos ganhadores são um verdadeiro filé. É claro que não vou transcrevê-las, mas essas informações me deixaram matutando. E como sou o rei da teoria “miojo” (aquela que fica pronta em três minutos...), resolvi registrar esses pensamentos, verdadeiros papo cabeça. Vamos lá.

É óbvio que ninguém ganha o Nobel sem merecê-lo, mas eu dividiria essa premiação em três tipos que, à falta de palavras mais adequadas, chamarei de prêmios “Solitário”, “Solidário” e “Coletivo”.

Vamos começar pelo Nobel de Literatura. Em 114 anos de premiação, só em quatro deles o prêmio foi dividido entre dois autores. Curiosamente, em sete anos não houve premiação. Quatro desses anos, sintomaticamente, correspondem à pauleira da Segunda Guerra.

Outra curiosidade é que dos 111 laureados, 77 são de países da Europa (só a França tem onze). Isso me parece coerente com a cultura humanista que imagino ser valorizada naquele continente.

Para ganhar esse prêmio, o autor depende única e exclusivamente de sua  criatividade e inspiração. Por isso eu o imaginei como prêmio solitário, pois não há relação direta entre ele e o estágio de desenvolvimento do país  escolhido. Se não fosse assim, não haveria autores de Madagascar ou da Ilha de Guadalupe, por exemplo. O que entristece é saber que dos quatro premiados na América do Sul, nenhum é do Brasil.

O que chamei de prêmio “solidário” é, lógico, o da Paz. Certamente esse prêmio está muito relacionado à questão dos conflitos armados em áreas conflagradas por rebeliões, guerras e congêneres ou ao devotamento de alguns a causas humanitárias. Já foram concedidas 103 premiações. Pelo menos dezessete delas foram dadas a líderes políticos (Obama, Mandela, Arafat, etc.).

Os prêmios Nobel que eu chamei de “Coletivos” são os restantes: Física, Química, Medicina e o prêmio de Ciências Econômicas. Agora é que vem a viagem na maionese: todos os ganhadores são top de linha quando se avalia o mérito de cada um, pois só há expoente em suas categorias, só feras. Então, porque essa bobagem de Coletivo?

Porque, para mim, os cientistas e pesquisadores que são contemplados precisam de um ambiente que favoreça e seja receptivo às pesquisas que realizam. Não basta apenas ser mega inteligente, pois recursos financeiros, instalações adequadas, equipamentos de ponta são fundamentais. E, acima de tudo, mesmo que não mensurável, também uma sociedade que valoriza o conhecimento, o mérito e o ensino de alta qualidade.

Resumindo: a menos que um gênio nascido aqui trabalhe e pesquise em um dos centros de excelência tecnológica existentes na Europa ou nos EUA, essa premiação continuará a ser por um bom tempo muita areia para o caminhãozinho brasileiro.

Então, voltando ao tal professor de filosofia, se ele quisesse um Nobel, só poderia tentar o da Paz ou o de Literatura. Porque o que faz o mundo avançar (para o bem e para o mal) é o conhecimento técnico de ponta e sua aplicação posterior ao dia a dia. Filósofos, sociólogos e outros profissionais da área de humanas podem explicar e interpretar o impacto das novas conquistas tecnológicas, mas nunca contribuirão diretamente para aumentar a produção de alimentos, por exemplo.

Para finalizar, mais alguns tira-gostos (ou curiosidades):
- Em 1972, Dom Helder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife, chegou a ser indicado para o Nobel da Paz, mas, por considerá-lo comunista, o governo Medici fez campanha na Europa para que essa indicação não vingasse.

- Os Estados Unidos são o país que tem o maior número de premiados – 256 prêmios Nobel. Desses, 89% são pesquisadores. O segundo colocado é a Alemanha.

- Nasceu no Brasil um dos dois cientistas que ganharam o premio de Medicina em 1960. Infelizmente, para nós,  nasceu, pois é inglês da gema (Ainda não foi desta vez!).

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5 Comentários

  1. Meu caro Marreta,
    Suas palavras foram extremamente elogiosas e eu arrisco-me a dizer que não as mereço. Pelo textos que Vossa Senhoria escreve, jamais percebi nenhum sinal de boiolagem de sua parte. Tenho plena convicção que Vossa Senhoria está na outra ponta (epa!) do espectro. Ainda assim (volto a dizer, não tenho nenhuma dúvida sobre sua masculinidade e hombridade), diria que os comentários elogiosos a mim dirigidos são lantejoulas de sua parte. Valeu!
    Blogson

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    1. Não só lantejoulas, também confetes, serpentinas, plumas e paetês; afinal estamos em vésperas de carnaval. Viva Clóvis Bornay.
      Sério : não é babação de ovo, não, você escreve bem, e observações bem interessantes.
      abraço

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  2. Caro Marreta, em alguns pontos o texto é realmente bom, mas peca quando tenta colocar a filosofia como ciência irrelevante. Será que realmente Aristóteles, Spinoza, Kant, Nietzsche e cia podem ser considerados tão secundários pelo fato de não ter um prêmio Nobel? Será que você teria a liberdade de ter um blog como este se não fosse o iluminismo? E a ética, moralidade? Esse paralelo da pobreza de conhecimento (e espírito) do Brasil e a falta de embasamento da nossa esquerda (e também da direita) com a área de humanas não tem nenhum sentido. Tudo anda de mãos dadas. O que adianta a União Soviética Stalinista chegar ao espaço com tanta imoralidade social? Enfim, passei como sempre para conferir o blog e não pude deixar de dar essa opinião. Renato

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    1. Sua opinião é sempre muito bem-vinda.
      Como vivo no meio, entendo que o Zé não quis colocar a filosofia como ciência irrelevante, mas sim o tal professor que faz mau uso dela. E isso, garanto-lhe, é o que mais há nas salas de aula, ditos professores de filosofia que transformam suas aulas em puro "embromation".
      E já conheci alguns professores(as) de filosofia para os quais a ética e a moral de que você fala são meramente conceitos moldáveis às suas conveniências; é como se, pelo fato da moral e ética fazerem parte de suas disciplinas, eles se tornassem donos delas, são os reis do "faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço; alguns (mas) dos que conheci são das pessoas mais antiéticas com quem já convivi.
      Abraço, e comente sempre por aqui

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  3. Minha opinião é a mesma. A maioria dos professores dessa área, filosofia, sociologia, história, é de esquerda extrema. Marxista da pesada! mas nem por isso devemos generalizar. Mas já me entendi com o Zé e tá tudo resolvido. rs abs

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