Pequeno Conto Noturno (48)

Zelda e Rubens acabam de trepar. Zelda fica estendida na cama, a sentir os músculos retornarem suas fibras às suas posições originais, a aproveitar os últimos instantes de lassidão e languidez. Rubens volta da cozinha, duas latas de cerveja nas mãos, abre-as, passa uma para Zelda.
Zelda se senta na cama, usa a parede de espaldar, bota ombros, omoplatas e coluna no lugar, abre as pernas, flecte os joelhos e puxa o lençol para si, que passa a cobrir seus ombro e peito esquerdos, umbigo e entrepernas.
- Rubens...
- Fala.
- Essa é o quê, a quarta ou quinta vez que venho aqui?
- Quarta.
- Reparei que não há vida por aqui.
- Está se referindo à minha mais recente performance?
Zelda ri. Zelda e Rubens sorvem grande gole de suas cervejas.
- Nada disso, até que você ainda tá vivo nesse aspecto, meia-vida, digamos.
Rubens ri.
- Bom, a meia-vida do urânio 235 é de setecentos e tantos milhões de anos, e ele continua radiativo, virulento, vou tomar como um elogio - Rubens esvazia a lata. Volta com mais duas.
- É sério, Rubens, não tem nenhum outro ser vivo por aqui.
- Claro que tem. Aos milhões, bilhões. Estão por toda parte, pelo ar, chão, em cima da mesa, nessa cama, quiçá até trilhões de bactérias, fungos, vírus.
- Vá tomar no cu, você entendeu, né, Rubens? Não tem uma planta que seja.
- Como não? E meu velho companheiro, o pé de boldo lá da sacada? Parceiro fiel, comigo há coisa de uns oito anos, boa cepa de genes, ele vai crescendo, vira quase que um arbusto, aí eu corto e replanto uns galhos e ele cresce viçoso, de novo.
- Boldo nem é planta, Rubens, é mato.
- Estabeleça a diferença.
- Tá querendo ganhar tempo pro pau subir de novo, né?
- Pode ser...
- Planta é planta, porra... dá flor, tem cheiro.
- O boldo também já deu flor uma vez, uns cachos roxos, cada flor parecendo um tamanco holandês, tenho fotos se quiser ver.
- Uma vez em oito anos.
- Sou um humilde contemplador do universo, contento-me com o que a natureza me oferece.
Zelda e Rubens arrematam a segunda lata. Rubens volta com mais duas.
- Já tive também uns dois cactos, morreram de sede.
- Tô falando sério, Rubens. Uma samambaia, uma azaleia, uma gérbera, uns crisântemos...
- Uma peônia...
- O quê?
- Esquece, história antiga. Iria morrer tudo, Zelda, jogo água e tal, mas não vai. Leu O Menino do Dedo Verde? Pois sou o cara do dedo cinza.
- Você conversava com elas, as acariciava?
- Tá de sacanagem, né?
- Verdade, elas têm que se sentir desejadas no ambiente.
- Quer que eu traga um refrigerante pra você, Zelda, acho que tá bebendo rápido demais.
- É sério.
- Pra falar a verdade, tentei uma vez, com umas begônias, mas não deu muito resultado. Não sei se elas eram surdas, mas eram mudinhas, entendeu?, não foi estabelecido um diálogo.
-Vá tomar no cu.
Rubens volta com mais duas latas.
- Então, um gato, Rubens. Adote um gato. Eles não vão te dar trabalho, são até parecidos com você, quietos, alheios, não escutam quando a gente fala, indiferentes, enigmáticos, ou vazios, sabe-se lá, e adoram lamber um cu.
Rubens ri, ri alto e pra caralho.
- Se gostam de lamber um cu, são dos meus, mas daí a adotar um...
- Eles são totalmente independentes, Rubens. Você deixa a comida na vasilha e eles comem na hora em que querem, vão comendo ao longo do dia, não tem que sair pra passear com eles, não tem que recolher os excrementos, basta ter uma caixa de areia e eles fazem tudo nela, no fim do dia, é só tirar a areia suja e pôr nova.
- Quer dizer que vou virar gari de gato? Garimpeiro de bosta de gato numa caixa de areia?
- Deixa de ser chato, eu arrumo um pra você. Melhor que seja uma fêmea. Está decidido, vou arrumar uma gatinha pra você, e você poderá chamá-la de Zelda, o que acha?
- Olha - começa Rubens, esvazia a lata, para de falar e busca mais duas; volta, senta-se de frente pra Zelda, olha pra sombra negra e densa entre as pernas dela que se faz translúcida pelo puído do lençol.
- Olha, por falar em gatos, bichanos etc, tem uma xaninha, sim, que pode me interessar - sem tirar os olhos da buceta cabeluda de Zelda.
- Ah, é? - Zelda que não é boba nem nada.
- É.
- E você vai cuidar bem da xaninha? Acariciar, fazer cafuné?
- Acaricio, faço cafuné, dou beijinhos e até cuido da higiene dela, dou uns banhos de língua nela...
- Dá uma aparadinha nos pelos dela quando estiver muito calor?
- Jamais. Aliás, ela está bem peluda, um belo tufo, é angorá?
Zelda ri.
- Safado, sabe que eu nunca toso a xaninha quando venho pra cá.
Rubens vai à geladeira e volta com mais duas. Zelda mandou o lençol que a cobria à puta que o pariu; porém, suas costas continuam apoiadas na parede; suas pernas, abertas e seus joelhos, flectidos.
- Quer mesmo a xaninha da Zelda, Rubens?
- Quero. E a caixa de areia, também.

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8 Comentários

  1. Um conto bem razoável. Poderia evitar esse "papo furado" e ter um pouco mais de sacanagem. E por falar nisso, eu adoro uma floresta bem densa.

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    1. Rapaz, por que todo mundo acho que esse é um blog de sacanagem? E acham que o Rubens é o quê,um super-homem? O cara tinha acabado de dar uma, tinha que ganhar tempo pro pau se recuperar.
      E se gosta, como eu, duma boa mata alta, entre na página inicial do blog e digite cláudia ohana no campo de busca, no canto esquerdo ao alto.

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  2. Se Rubens comesse amendoim ou tremoço...a recuperação seria bem mais rápida!

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    1. Pããããta que o pariu!!! O Rubens come uma buceta nova a cada conto e ainda fica sendo zoado, "podia ter mais sacanagem..., "se comesse amendoim ou tremoço..."
      É dafo!

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  3. Acho q Rubens come sempre as mesmas quatro ou cinco bucetas... Apenas com "penteados" diferentes. Estou errada? Bjs. Zelda

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