Um Dia na Vida (4)

Seis e vinte, seis e meia da manhã. Em pé, encostada ao pilar da cobertura da parada de ônibus, alheia ao grasnar dos carros e das conversas à sua volta, alheia aos bafios e às cusparadas de monóxido de carbono que transformam sua manhã num fog fuliginoso e cianótico, ela saboreia o único luxo de sua vida, o único prazer de seu dia, um pão de queijo com café de coador comprados ao ambulante.
Luxo secreto e perigoso, que, se de conhecimento de seu marido, valeria-lhe graves agressões; verbais, num dia de sorte, mas há tempos ela não tem um dia desses, de sorte. Luxo cujo valor, somado pelo ambulante ao fim do mês, representa enorme desfalque, irrecuperável rombo à contabilidade de seu lar, um golpe de misericórida, um tiro na testa de seu agonizante e em coma orçamento doméstico.
E é a única coisa que macula esse seu furtivo e fugaz prazer, lembrar do marido. O marido sempre estraga seu prazer, de uma forma ou de outra. Hoje, a lembrança do marido se faz ainda mais viva, pelo cheiro dele que perspira de sua buceta e lhe atinge as narinas. Apesar de muito cedo, o calor já se faz dono do dia e ela teve que andar um bom pedaço para chegar à parada de ônibus. O calor do dia mais o atrito das roupas a fazem suar e a envolvem com as emanações cheirando a água sanitária do marido, cercam-na com os fantasmas e os miasmas vigilantes e acusadores dele.
Ontem, ele a usou à hora de se deitarem. Como a usa em todos os dias, quase que invariavelmente. Como faz quase que invariavelmente, ele lhe separou rudemente os joelhos, deitou-se sem nenhum cuidado sobre ela, deu uma escarrada na palma da mão - e o seu cuspe estava escasso; bebera mais que o habitual -, passou na cabeça do pau e meteu. Entrou meio que dobrado, meio que meia bomba, mas entrou e ganhou tônus dentro dela. Mais um minuto, pensou ela - como pensa quase que invariavelmente -, trinta ou quarenta segundos que fossem e ela, tinha a certeza, conseguiria também gozar. Mas ele nunca lhe dá esses trinta ou quarenta segundos. Quase que invariavelmente, ela vai ao chuveiro e se lava; às vezes, termina o que o marido começou. Mas não ontem. Tamanhas eram suas prostração e morbidez que ela não se lavou. E, agora, seu castigo, o marido a lhe acompanhar em seu lauto desjejum, em seu pão de queijo com café de coador comprados ao ambulante, luxo pelo qual ela não pode pagar - literalmente.
Não bastasse o marido a lhe sair pelos poros, hoje, o ambulante cobrou-lhe o débito, a partir de amanhã não fará mais fiado. Foi assim com o ambulante anterior, localizado a três quarteirões abaixo  e dois à esquerda do atual, foi assim com o anterior ao anterior, com ponto a mais quatro quadras abaixo e quatro à esquerda do outro, e foi assim com o anterior ao anterior ao anterior, que mantém seu carrinho a quase um quilômetro além, antes da linha férrea.
Assim, de ambulante em ambulante, ela toma o ônibus em locais cada vez mais distantes de seu ponto de saída, de forma que o pega já lotado, abarrotado, sendo necessário se espremer e lutar mesmo por um lugar em pé. Pouco minutos de viagem, um sujeito, um desses encoxadores tão comuns nos ônibus urbanos, se encosta na bunda dela. Ela sempre rechaçou esses chacais. Mas não hoje. Tamanhas são suas prostração e morbidez que ela não se afasta do pau do cara. Empina levemente a bunda e a comprime contra o pau dele, que, frente não só à conivência como também à reciprocidade dela, aproxima mais o corpo, cola-se a ela. 
O pau dele, ela estima pela pressão que ele exerce no rego de suas nádegas, é menor que o do seu marido, porém, muito mais duro, muito mais respeitoso nesse sentido. Ela empurra a bunda para trás, ele esfrega e resfolega abafado, uma das mãos dele se aferra nas ancas dela, ajudando a manter o equilíbrio dos dois no ônibus em movimento. 
Confiando na força e no arrimo do tórax, do pau, das pernas e do braço do cara cujos dedos quase lhe varam o jeans, ela se solta : com um movimento da mão esquerda, coloca a bolsa de encontro à virilha, para esconder o movimento da mão direita, que se enfia por entre a calça e a pele, por entre a calcinha e os pentelhos e encontra sua buceta molhada, do suor da caminhada, de sua excitação, do marido.
Mais um minuto, pensa ela a dedilhar o grelo, mais trinta ou quarenta segundos que sejam e ela, tem certeza, gozará. O corpo do cara se contrai todo, como se uma cãibra acometesse todos os seus músculos, e relaxa, desmonta feito marionete que teve seus fios cortados. Uma quentura úmida e viscosa atravessa as fibras do jeans e vai se apegar a uma de suas nádegas. 
O encoxador também não lhe concedeu os trinta ou quarenta segundos.

Postar um comentário

5 Comentários

  1. Muito bom mesmo, me fez lembrar da Dama da Lotação.
    "J"

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Nunca tive nenhum tesão na Sônia Braga! Na verdade, não a considero nem bonita muito menos talentosa.

      Excluir
    2. E????
      Eu gosto do enredo e tb não tenho tesão na Sônia Braga rsrsrs
      "J"

      Excluir
    3. Começou a lambecao.
      "I".

      Excluir
  2. (risos)
    Adoroooo, lambe aqui ó!!! KKKKKKKKKKK
    "J"

    ResponderExcluir