Pequeno Conto Noturno (83)

Quase meia-noite. Quase uma hora esperando por Rubens na entrada do velho prédio dele. Calil sabe que só tem um jeito de encontrar Rubens sem ser por acaso, ficar de campana na porta dele. Rubens não tem telefone, de nenhum tipo. Também, há anos, cortou o fio que ligava o interfone do seu apartamento ao painel numérico da portaria do prédio.
- Puta que o pariu! Chego em casa, cansado pra caralho, louco pra tomar uma no sossego e dou de cara logo com quem! Uma gostosa me esperando, que é bom, nada!
- E quando a gostosa vem, você não come, né, Rubão?
- Tá falando do estrupício daquela tua prima, que você empurrou pra cima de mim, né? Grande barca furada, aquela tua prima. E é melhor ir tocar em outra freguesia que hoje eu só tenho cerveja suficiente pra mim, isso se eu não tiver que sair de madrugada pra comprar mais, agora que vi a tua cara.
- É bom te ver também, Rubão. E eu trouxe cerveja, porra. E da boa - e Calil ergue dois fardos do chão, de trás de suas pernas, ingressos para subir ao apartamento de Rubens.
- O que aconteceu - pergunta Rubens -, participou da pilhagem da carga de algum caminhão de cerveja que tombou na estrada?
- Nada, Rubão. Cerveja comprada com dinheiro suado.
- E quem foi que suou pra ganhar esse dinheiro?
- Voltei a comer aquela evangélica montada na grana, lembra dela?
- Sei, aquela que teve câncer nos peitos e, quando ela foi colocar as próteses mamárias, você pediu pra ela colocar uma com uns manequins acima das que tinham sido extirpadas, né? Um poço de sensibilidade,você, Calil.
- Vamos subir ou não, porra?
- Que remédio...
Rubens abre uma lata para cada um e se sentam à pequena sacada.
- Juro que essa eu não entendi, Rubão, a gente se encontrou aquele dia no mercado e você reclamou que tava precisando de uma buceta nova, um cuzinho sem compromisso, só pra espairecer. Aí eu falei com aquela minha prima biscate, a Jéssica, elogiei você pra ela, fiz tua propaganda, armei a ponta pra você e ela me falou que você não virou nada. Enviadou, porra? Vai dizer que ela não é gostosa pra caralho?
- É, gostosa, ela é.
- O que foi, então, porra?
- Ela chegou, subiu e eu até fiquei entesado quando vi aqueles peitões, silicone, né?, mas uns putas duns peitões, não gostei muito da coxa inteira tatuada, com um peixe e uma gueixa olhando pra mim, mas vá lá...
Os dois acabam as latas e Calil busca mais duas.
- Sabe qual foi a primeira coisa que ela falou, Calil? 
    "Onde tem uma tomada pra eu carregar meu smart?".
- Um celular gigante, com uma capa cravejada de "brilhantes".
- Bem coisa de puta mesmo, né, Rubão?
- Pois é. Se ela tivesse chegado e eu tivesse levado ela direto pro quarto, te garanto que teria dado umas boas metidas nela, teria comido até o cu, mas não dava pra ir direto pro crime.
- É, ela é puta, Rubão, dadeira que só ela, mas gosta de fazer um cu doce, fazer uma cena, como se o cara tivesse que conquistar ela, mesmo ela sabendo que o cara sabe que ela é bola na caçapa na certa.
- Ela sentou bem ai onde você está, sainha bem curta, cruzou os pernões, dava pra ver a entrada da caverna. Falou que até que eu não era tão velho e acabado como você tinha dito.
- Quis te dar essa força, Rubão, é o velho truque da gente baixar as expectativas da mina, ela acha que vai encontrar uma coisa pavorosa e quando vê que é ruim, mas nem tanto, acaba ficando mais animada.
- Tá certo. Aí perguntei se ela queria uma cerveja.
    "Só tomo se for Heineken ou Stella".
-Hà, há, há! Que puta, Rubão, que puta! Deu Stella pra ela?
- Falei que tinha da Heineken, fui na cozinha, derramei uma lata de Lokal numa caneca e ela bebeu sem perceber a diferença.
- Lokal? Rubão, você pode não ter fodido a Jéssica, mas que sacaneou legal com ela, você sacaneou. Aliás, Rubão, que pai e mãe põe a porra de um nome desse na filha, Jéssica? É garantia de ser biscate.
- Aí começou a jogar um pouco de conversa fora, perguntou o que eu fazia, se eu te conhecia há muito tempo, que tava concluindo um curso de esteticista com especialização em arquitetura de sobrancelha; aí o pau já foi se retraindo. Perguntou se podia ligar a televisão.
- Aquela porra de tubo ali? Essa merda ainda funciona?
- Não. Foi o que respondi. 
    "Então por que você não joga fora e compra outra".
- Falei pra ela que a televisão sem som e sem imagem já é uma bonita escultura.
- Puta que o pariu!!!
Calil foi e voltou com mais duas latas.
- Ela ficou me olhando sem saber que reação devia ter. Não sabia se ria, se concordava, se eu tava doido.
    "Como você faz pra acompanhar a Fazenda, você tá torcendo pro Caíque ou pro Rafael Ilha?".
- Há, há, há! Imagino a tua cara de cu, Rubão.
- Falei que eu tava torcendo pra Vaca Estrela e pro Boi Fubá. Fui na cozinha e voltei com mais duas canecas cheias de Lokal. Ela puxou a cadeira pro meu lado, eu pus a mão na coxa dela e ela chegou a boca cheia de espuma perto da minha. Lasquei um beijo, um beijo bom.
    " 'Cê não tem uma musiquinha pra gente ouvir?".
- Dei mais um beijo nela, peguei o toca-cd e coloquei um pen drive...
- Pen drive, Rubão, pen drive?
- Vai tomar no cu! Coloquei um pen drive com um monte de álbuns lá, o Raul, o Chico, o Caetano, Oswaldo Montenegro, Tom Jobim, Engenheiros, Barão, Adoniran... pus no modo aleatório e deixei tocando. Ela continuou jogando conversa fora e eu, beijando e já dandos uns apertos naqueles peitos, tentando me animar, não escutar o que ela falava. Pega mais duas lá, Calil.
- Tó, Rubão, essa tá trincando. Até ai parece que tava tudo certo.
- Certo o caralho. Depois de umas três ou quatro músicas, outra bomba.
    " 'Cê tem João Bosco e Vinicius?".
- Falei que eu tinha João Bosco e também Vinícius, mas que não sabia que eles tinham feito algum trabalho juntos. Santa ingenuidade, a minha, Calil. Ou tentativa de me enganar, de ver se ainda salvava a noite.
    " 'Fizeram sim, vou cantar e você vai lembrar".
- E começou a cantar uma porra dum chora e me liga e a sacolejar no que acho que devia ser a coreografia dos caralhos que gravaram aquela merda.
    "Sertanejo universitário, Rubens, tá bombando".
- E falou mais uma porrada de nomes escrotos dessas duplas de viados. Tentei ainda salvar a noite, falei que eu tinha Fábio Jr, se podia ser.
- Tacada de mestre, Rubão. Fábio Jr. não tem erro, a mulherada se mela.
- Ela falou que podia e, em pé que já estava, levantou os braços, começou a balançá-los de um lado para o outro e cantar, carne e unha, alma  gêmea, bate coração... puta que o pariu!
- Melhor que o Meteoro da Paixão, Rubão.
- O quê? Ai ela veio e sentou no meu colo de frente pra mim, pernas abertas, me puxou bem pra perto, encostou a buceta na minha barriga.
- E o Fábio Jr. mandando ver no pen drive, Rubão.
- O Fábio Jr.mandando ver. Beijei ela de novo, desci as alças da blusa dela e mamei aqueles peitões, dava pra sentir o cheiro da buceta dela, Calil.
- Peraí que já volto.
- Não vai bater punheta no meu banheiro, não, né, filho da puta?
Calil volta com mais duas latas.
- Só que tava estranho, Calil, o tempo todo que eu tava beijando ela, mamando os peitões, parecia que ela tava se sentindo filmada ou fotografada por alguma câmera escondida, ficava fazendo caras e bocas, umas poses meio que ensaiadas, como se estivesse participando de alguma dessas porras de reality shows, ou fazendo um vídeo para ganhar milhões de curtidas no youtube, como se ela fosse ficar fazendo um monte de selfies durante a foda. Cheguei a enfiar o dedo, três dedos, na buceta dela, ela gozou duas vezes, mas quando ela pediu pra ir pro quarto, que ela queria me mostrar como é que se senta num pau, eu falei que era melhor ela ir embora, que eu tava achando que aquilo não ia rolar.
- E ela, Rubão?
- Não falou nada, só ficou me olhando sem entender porra nenhuma. Só segurou forte a minha mão que ainda tava com os três dedos enfiados nela, ficou metendo e tirando eles mais um pouco, se esfregando e rebolando, gozou mais uma vez, ajeitou a calcinha, recolocou as alças da blusa nos ombros e foi embora.
- Mas que merda foi essa, Rubão?
- Sei lá, aquele monte de futilidades, uma puta duma falta de assunto, aquele monte de nada com nada... sei lá, não deu liga, o santo não bateu, sabe?, não teve nenhum envolvimento... perdi o tesão.
- Envolvimento, Rubão, sei...
- É, seu porra. De qualquer maneira, eu consegui falar com a Yrina e ela vem aqui amanhã, passar a noite, talvez.
- Yrina? Aquele seu veeeeeeelho caso  mal resolvido, Rubão?
- É, mas pelo menos dá pra conversar com ela, rir com ela, sentir proximidade...
- Envolvimento, conexão, né, Rubão?
- É.
Rubens vai e volta com mais duas latas.
- É... não é à toa o que andam dizendo por aí, Rubão.
- O quê?
- Que você virou demissexual.
- Seu cu!!!   

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13 Comentários

  1. KKKKKKKKK
    Eu vi o título e já comecei a rir. O termo, antes desconhecido pra você (e que agora deve martelar incessantemente na sua cabeça), deu pano pra manga, ein, Marreta?

    Vou te apresentar mais alguns. Quero ver quantos posts vai gerar. Kkkkkk

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    1. Olha, nem foi tanto o termo em si; foram mais os comentários suscitados pela postagem.

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  2. Porra, meu irmão, o cara só com os dedos fazer a mina gostar 3 vezes? Só essa parte que é ficção.

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    1. Homem nenhum "faz" a mulher gozar, meu caro. Ele só dá o suporte técnico, a rola, o dedo, a língua. A mulher goza - as que aprenderam - é com ela mesma. Ilusão nossa achar que não.
      Tem uma música bem legal do Arnaldo Antunes sobre isso, Essa Mulher :
      https://www.letras.mus.br/arnaldo-antunes/65413/

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    2. Então o negocio tá mais feio pra mim do que eu pensava...

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  3. Já pensou em reunir esses contos e postar como ebook?

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    1. Eu acho que seria uma boa ideia. Aliás, já sugeri outros livros também. Um, obrigatório, seria dos poemas, área em que ele manda super bem.

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    2. Compensa no aspecto de organizar tudo e oferecer aos interessados. E para você ter um livro, seu, publicado a custo zero. Você mesmo faz isso hoje em dia e posta na Amazon.
      Não está me trazendo retorno financeiro. Aliás, coloco pelo preço mais baixo e ainda ofereço em promoções para download grátis. Afinal, meu objetivo é ser lido.
      Como não me deu custo algum, então prejuízo não possuo.
      Muitas pessoas anônimas até ganham uns trocados mensais para a cerveja.

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    3. Rapaz, os trocados mensais para a cerveja me interessaram muito.
      A Amazon fica com alguma porcentagem?
      O seu livro, é sobre o quê?
      E o mais difícil : eu não tenho a menor ideia de como fazer um livro digital.

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    4. Não tem mistério.

      Há planos de porcentagem. No meu caso, 35% é dela.

      Estou com três lá: Poesia, infantil em prosa e um conto.

      Melhor caminho: https://kdp.amazon.com/pt_BR/

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  4. Pobre Jéssica, tomou (no) lokal mas não chegou a ver stellas.

    Enfim, tô achando que o Rubens é praticante inconsciente da sapiossexualidade, isso sim.

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    1. Rapaz, eu morro de tesão em jornalistas, Ana Paula Padrão, Cecília Malan, Carla Vilhena, Nadja Haddad...

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