Livros Do MEC São Vendidos Em Sebos

Iniciei minha vida escolar com 6 anos de idade, em 1973. À boa época, escola era um local de obrigações e responsabilidades antes de tudo.
Tínhamos uniforme, camisa branca de botões e insígnia da escola no bolso, bermuda preta de tergal e sapato preto, e o uniforme era obrigatório, não tinha choro. Aos que , comprovadamente, a aquisição da vestimenta estivesse fora de suas posses, a APM (associação de pais e mestres) prestava auxílio, mas eram poucos os que a ela recorriam, era uma questão de honra o pai prover o uniforme aos filhos.
Material escolar também era obrigatório, inclusive os livros didáticos, ítem mais oneroso do arsenal do aluno, mas igualmente não tinha desculpa : tinha que ter os livros. E os pais se viravam, cada um dava seu jeito, a escola até passava listas de adesão de compra e negociava preços com as editoras, mas todo aluno tinha que ter os livros. A chegada dos livros novos era um acontecimento para nós, folheávamos cuidadosamente cada um deles, curiosos de seu conteúdo e receosos de que o mesmo superasse nossas capacidades de aprendizado, cada série era mais difícil que a outra, havia lendas terríveis sobre a sétima série. Os livros eram zelosamente encapados pelas mães, para que melhor se conservassem - elas sabiam o quanto eles haviam lhes custado - e pudessem, inclusive, ser aproveitados pelos irmãos ou primos menores nos próximos anos.
Há quarenta anos era dificílimo municiar um filho e mantê-lo na escola, e a maioria o fazia. Suava, mas fazia. E logicamente cobrava do filho o bom uso e conservação do material.
Já de algum tempo para cá, os governos dão tudo para os alunos : lápis, cadernos, canetas, borracha, régua, mochilas e livros, todos os livros, e bons livros, das melhores editoras. O resultado desta esmola é mais que prevísivel, quem não trabalha para ter o que tem, não dá o mínimo valor. Pobre é foda, pobre brasileiro, pior ainda. Reclama que não estuda por falta de condições, aí ganha tudo e sabem o que fazem? Quebram as réguas e lápis em brincadeiras idiotas, arrancam folhas em branco dos cadernos para fazer aviõezinhos e bolinhas de papel, detonam os livros, é comum ver livros esquecidos embaixo das carteiras depois de poucos dias de seu recebimento e já em estado de penúria, sem capa, páginas tortas, cheias de orelhas, riscados, um verdadeiro crime. Vejo isso todos os dias, todos os anos.
E a maioria, apesar de tê-los recebido gratuitamente, não os leva para as salas de aula. É comum o professor iniciar uma atividade no livro didático e constatar que, de uma sala de quarenta alunos, apenas uns cinco, oito, dez alunos, estão de posse do livro. Os alunos alegam que o peso dos livros é excessivo, que ficam com dores nas costas de carregá-los. Deviam eram ser chamados às suas verdadeiras vocações e postos a puxar uma carroça pra ver o é uma verdadeira dor nas costas. Meninos e meninas, de dezesseis, dezessete anos, já mortos, cansados, preguiçosos. Alguns até conseguem atestados médicos comprovando sua impossibilidade de carregar o material. Só que para conversar em aula, namorar no pátio e chutar bola a esmo nas aulas de educação física, eles têm uma saúde de aço.
Preguiçosos, a escola atual cria gerações de moloides, com o aval e comodidade de pais idem.
Li, agora, que a Polícia Federal apreendeu na quinta-feira, 17/02/11, cerca de 2.000 livros do Ministério da Educação que eram vendidos em um sebo em Natal (RN). Ou seja, as famílias ganham gratuitamente os livros e os vendem nos sebos da cidade para levantar um troco. Não foi surpresa nenhuma para mim. Eu era frequentador regular de sebos até há uns três, quatro anos e vi muito disso. Todo livro recebido pelo aluno deve ser devolvido à escola no final do ano letivo, mas o controle disso é falho, como todo controle no que é público. E para quem não dá o menor valor à educação e aos livros, como é o caso do grosso de nossa população, qualquer trocado pago pelo dono do sebo é lucro.
Claro que os livros continuarão a ser distribuídos como esmola, há interesses eleitoreiros nisso, mas nenhum governo tinha que dar porra nenhuma de graça, os governos podiam até subsidiar uma parte e cobrar um preço simbólico da cada livro, mas o sujeito tinha que pagar, para dar valor.
Alunos portam celulares de último tipo, desfilam com tênis que custam mais de um salário minímo, as meninas fazem escovas progressivas nos cabelos, fazem tatuagens, colocam piercings etc etc, tudo caríssimo. Já vi mães se revoltarem e comparecerem em mutirão à escola para xingar um professor de português que havia pedido a compra de um livro paradidático, portanto fora do pacote dado pelo governo. Preço do livro : R$ 18,00. Esse povinho nosso, a tribo de Gérson, tinha tudo é que apanhar na cara e passar o dia inteiro com uma pesada enxada nas mãos.
Livros do governo são vendidos em sebos; apartamentos do programa Minha Casa, Minha Vida, avaliados em R$ 15 mil, são vendidos a R$ 500 por seus felizes moradores, que voltam a morar nas favelas de onde saíram; terras ganhas em reforma agrária também são arrendadas ou negociadas das mais diversas maneiras pelos "homens da terra" que as receberam ou as invadiram.
Tudo pode nesse paisinho de merda e de merdas. Tudo é legal na pátria de Gérson. Afinal, o negócio é levar vantagem em tudo, certo?

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