Não acredito em vidas pregressas. Nem em futuras. Nem em pré nem em reencarnações. Se acreditasse em vidas passadas, teria que correr o risco de uma futura, pois essa atual seria a futura de uma anterior. E a sala de espera para uma próxima . E eu não quero outra. Quero que tudo acabe aqui. Nem céu nem inferno. Só dormir profundamente, como disse o Bandeira.
Mas a existência ou não das múltiplas existências está cagando e andando para o que eu acredito. As coisas existem ou inexistem alheias à crença de qualquer um. Por isso, sempre as rejeitei, as crenças.
Contudo, só a título de exercício imaginativo e admitindo a ocorrência de um moto-perpétuo de vidas, desconfio de que algum ancestral "espiritual" meu, lá no paleolítico ou no neolítico, tenha sido um daqueles caçadores-coletores. Até porque, naquela época, não tinha bolsa família, auxílio Brasil e outras mamatas pra vagabundos : era a sábia lei da natureza : bicho que não caça, não come. E, assim, as coisas deveriam ter sido mantidas.
Digo isso porque, mesmo vivendo em um horrendo centro urbano com mais de 700 mil habitantes, ando a pé - não dirijo nem tenho CNH - e pelo meu caminho, coleto um punhado de coisas, frutos e ervas.
O centro da cidade e os bairros mais próximos a ele, que são os mais antigos, são ainda relativamente bem arborizados; assim como os canteiros centrais das barulhentas e fuliginosas avenidas.
Pelas rotas alternativas que sigo de casa para o trabalho e vice-versa (e tenho algumas delas; dizem fazer bem para memória), sei onde encontrar pés de acerola, pitanga, amora, jambolão, goiaba, manga, jambo-amarelo e jambo-vermelho, nêspera, tamarindo, graviola e até o quase extinto araçá. Onde e em que épocas do ano frutificam.
Passo por eles e vou coletando e comendo.
Apesar de ocorrerem em número bem menor que as frutíferas, sei também onde coletar certas ervas, para chá ou tempero. Essas, geralmente, crescem aos pés das árvores nas calçadas, na terra daquele espaço de cimento que limita as raízes das árvores. Muitas vezes, nem foram plantadas por mãos humanas, suas sementes ali fizeram morada trazidas pelo vento, pássaros ou insetos.
Conheço bons lugares para coletar boldo, alfavaca, manjericão, pimenta-rosa, hibisco, malva, capim- cidreira e, a minha preferida, a erva-cidreira, também chamada de melissa. Três ou quatro vezes por semana, tomo chá dela ao fim da tarde, acalentadora beberagem que está ameaçada agora.
Abastecia-me de erva-cidreira em três mananciais. Dois menorzinhos, sem que eu precisasse mudar muito o meu caminho. E um terceiro, que era um verdadeiro arbusto; porém, um pouco fora de mão, custava uns quarteirões a mais em meu trajeto. Valia-me dele quando o "estoque" dos menores começava a rarear e eu lhes dava, então, um descanso de 10 dias, duas semanas, para que regenerassem suas folhas.
Pois ontem, desviei-me os quarteirões necessários para a minha colheita e surpresa : haviam cortado meu pezinho de erva-cidreira. Ele e mais um monte de outros matos, inclusive florzinhas brancas de maria-sem-vergonha, que cresciam ao pé de uma pitangueira, foram sumariamente arrancados. Um pouco de seus restos mortais ainda jaziam ao meio-fio.
Pããããããta que o pariu!!!! Cortaram o meu pezinho de erva-cidreira que tinha nascido ali!!!!
O que me fez, instantaneamente, lembrar de uma piada, do Costinha, da velhinha em cujo quintal brotara um pezinho de caralho. Vamos a ela :
"A velhinha, viúva, já toda enrugadinha, sequinha, até tinha banheiro com vaso sanitário e tal em casa, mas oriunda que era da zona rural e arraigada aos seus hábitos, todas as noites, antes de dormir, se dirigia ao fundos do quintal da casa, no escuro, agachava-se, ficava de cócoras e ssssshhhhhh... fazia o seu xixinho num canteiro de plantas.
Um dia, um tarado de passagem viu a velhinha se aliviando e pensou : - vou comer essa velhinha! No dia seguinte, à noite, o tarado pulou para dentro quintal, se enterrou no canteiro, deixou só o cacete em riste pra fora e ficou esperando a velhinha. A velhinha veio, abaixou a calcinha, agachou-se para mijar e sentiu uma certa resistência, uma certa protuberância vinda da terra. Foi esfregando a ameixinha seca no pau do tarado, esfregando e se sentou. Sentou e deu a sua mijadinha. Acabou e, sem se levantar, deu aquela chacoalhada para se livrar das últimas gotas. Chacoalhou uma vez, chacoalhou de novo, de novo, de novo, de novo, de novo... E foi se deitar em paz, como há muito tempo não.
E assim a coisa seguiu. Todas as noites o tarado se enterrava e velhinha ia dar a sua mijadinha. Até que um dia, por algum motivo, o tarado teve que faltar.
2 Comentários
Quem diria que meu amigo virtual Marreta é um caçador-coletor dos tempos modernos? Gostei demais da "erudição botânica"! Eu sou um sujeito urbano até a alma, mas a familia de minha mãe veio da roça, morou e viveu na roça. Lembro-me de meu pai comentando o constrangimento sentido quando um parente de minha mãe começou a falar de frutos que estavam desaparecendo. O caipira mencionou cagaiteira, cu de pinto e outras de que não me lembro mais. Meu pai (que era muito branco e tímido) disse ter ficado roxo de vergonha com a simplicidade do sujeito.
ResponderExcluirErudição botânica? Menos, meu amigo, menos. No máximo, eu posso ser considerado um botanicuzinho.
ExcluirCu de pinto? Vou pesquisar!!!