Lodaçal

Só pode estar aqui dentro,
Essa coisa pastosa, rançosa. 
Não estão as pessoas todas por aí, 
Festivas, sorridentes, 
Atingindo-se com bons-dias, 
Boas-tardes e boas-noites? 

Só pode estar aqui dentro 
Essa fria cinza, poeira ranzinza. 
Não estão todos seguindo contentes, 
Doces e perfumados, 
Aconchegados em suas alegrias de hiena? 

Então, só pode mesmo estar aqui dentro, 
Esse visgo, esse piche gosmento, 
Esse amargor e esse azedume. 
Não pode vir de fora tal nauseabundo odor de estrume. 
Não estão todos felizes, 
Sem enxergar as grades, 
E procriando? 

Por isso quero drenar todo meu sangue, 
Ficar exangue. 
Desidratar, 
Afogar em minha transpiração lodosa de mangue. 
Bombear, pelo esôfago, 
Muco, ácido e fel. 
Vomitar essa podre melancolia, 
Esse tétano que me achaca os rins 
E me arqueia as costas.

Só pode vir de dentro. 

Por isso, quero inflar, 
Inchar e explodir 
Em milhões de pedaços de bosta.

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