Olho para o copo vazio, ressequido.
E a um comando mental,
Comando mental, não.
Menos, bem menos disso,
A um desejo
Peixes-palhaço vêm da cozinha com garrafões
E despejam bebida púrpura em minha taça.
E correm,
Escorregadios, vadios, mucosos,
Para os entremeios peçonhentos
Da samambaia pendente em meu teto
(se teto da casa ou meu, dá no mesmo).
Levo a púrpura aos lábios, à língua, ao palato nublado
E saúdo os peixes-palhaço enredados,
Porém livres,
Na minha samambaia,
Presos aos xaxins – bucetas vegetais
(interlúdio para digressões, cochilares, ventos verdes de menta e atmosferas pesarosas de gloxínias).
Ora o sofá reveste-se de minha epiderme,
Áspero, seco, poros, pêlos e ácaros,
Repleto de suores e imperfeições.
Ora eu estou encapado de tecido azul,
Tecido acelular, macio ao tato, resplandecente ao teto,
Espumas que respiram, suspiram e, às vezes, riem.
Somos líquen de um ser e um não-ser:
Uma sinabiose proscrita.
O copo de novo árido;
Os garrafões, estéreis e atônitos.
Lanço uns trocados, uns níqueis aos palhaços escamados,
Que zarpam na cata de mais púrpura beberagem.
Ao mercado mais próximo
Ou a um que esteja em promoção
Ou um que esteja aberto nessa hora de relógios distraídos.
(interlúdio para lampejos de desmaios, alheamentos, flatos de fósforo branco, luares de Io e Titã).
E os palhaços com guelras não retornam,
Fugiram, embolsaram meus níqueis no cu.
Sabe-se lá, afundaram-se abissalmente
Na bebida púrpura da qual eram reles entregadores;
Conspurcaram meus cobres em cinemas e pipocas de shopping centers;
Ou – e aqui há uma possibilidade de perdão –
Enfurnaram-se em puteiros de anêmonas-do-mar.
Restamos, à espera,
Eu, o sofá, o sofá-eu
E minha samambaia,
Estranhamente evoluída em salgueiro.
A chorar, chorar, chorar.
(e o que se principiou em verde, finou-se em roxo).
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