Jesus Cristo, O Filho Do Boto

A lenda do boto amazônico é uma das mais conhecidas de nosso  rico e (injustamente) desprezado folclore. Resumindo, conta-se que o boto, em noites de lua cheia e quando está a acontecer festas nas comunidades ribeirinhas, emerge das águas na forma de um belo homem, muito bem trajado com seu impecável terno branco e sempre usando um chapéu, que lhe cobriria o orifício que os botos têm na cabeça, única parte dele que não sofre total transmutação.
O safado, muito bom de papo e dança, acaba por seduzir a mais bela donzela da aldeia, leva-a para as águas rasas de um banco de areia, passa-lhe a vara e a abandona grávida. Na Amazônia, a paternidade de filho de pai desconhecido é atribuída ao boto. Está cheio de filho de boto por lá, e as criancinhas carregam essa pecha pelo resto da vida, fulano é filho do boto.
Do jeito que as coisas andam chatas no mundo de hoje, devem até existir ONGs de defesa aos filhos do boto, contra preconceito, discriminação e bullying. Os filhos do boto sofrem uma zombaria das mais injustas. Afinal de contas, um deles é idolatrado e tem seu nascimento festejado em todo o mundo ocidental : Jesus Cristo.
Jesus Cristo também é filho do boto.
Reza o mito que Maria fora entregue com 12 anos de idade a José, um viúvo e  já um ancião para os padrões da época. José não só vivera A.C. como também A.V. (antes do viagra), portanto é bem plausível que Maria nunca tenha sido tocada por ele como mulher. Outros, mais românticos, dizem que, dada a diferença de idade, José tinha por ela um amor filial, que a teria tomado em sua guarda como quem adota um filho.
Mas o tempo passou. Maria, já com 16 anos, idade em que a vontade é maior que qualquer caráter, ouviu um sussuro à sua janela, José estava fora, um trabalho em outra cidade. Era uma voz que lhe elogiava a beleza e doçura. Voz que se revelou um anjo, quando perguntado de sua identidade. Um anjo que trazia um segredo do Senhor para Maria, e para sabê-lo, bastaria ela abrir-lhe a porta. Maria abriu e o anjo entrou com tudo. Nessa noite, Jesus foi concebido.
José retorna à casa e encontra Maria embuchada, que se saiu belamente bem com a história do Anjo da Anunciação. Anjo lazarento que não deixou uma única penugem de sua asa para Maria corroborar seu relato. Muita confiança na boa-fé do corno José.
O Anjo da Anunciação é o Boto de Deus! É o Carlos Alberto Riccelli do Senhor!
Muitas vezes,  já imaginei a surpresa e o dilema de José.  Acreditar, ou não, nesse 171 da Maria sobre o Anjo da Anunciação? Tornar-se, ou não, o santo padroeiro dos cornos? Mas nunca tinha imaginado, admito, a reação de Maria ao saber da indesejada e ilícita gravidez.
Uma Igreja, pasmem, imaginou por mim e afixou cartazes em seus quadros de aviso que estão dando o que falar. Os cartazes pregados na Igreja de São Mateus, na Nova Zelândia, mostram uma Maria segurando um teste de gravidez com um resultado rosa-positivo, uma Maria assustada, perplexa.
A igreja justifica dizendo que a ideia é “evitar o sentimento e a banalidade” e “provocar uma faísca de pensamento e conversa”. "O Natal é real. É sobre uma gravidez real, um mãe de verdade e uma criança. É sobre ansiedade, coragem e esperança verdadeiras", disse o vigário Glynn Cardy, da igreja de Auckland. Ele explica que a gravidez inesperada de Maria teria sido chocante. Afinal, ela era pobre, solteira e jovem. “Ela, certamente, não foi a primeira mulher nessa situação e nem a última”, contextualiza o vigário.
Mas é isso mesmo! Nada é real. Tudo é mito. Tudo é lenda. E todo sincretismo deve ser tolerado e bem-vindo.
Festejemos o Natal e a avelã nossa de cada dia. Festejemos o Papai Noel da Coca-Cola. E Jesus Cristo, o Filho do Boto.
Abaixo, o boto :

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