Oscar Niemeyer In The Sky With Diamonds

Oscar Niemeyer, ateu das antigas, morreu e foi pro Céu (o absurdo já começa aí, mas vai melhorar muito ainda). Chegou ao paraíso empunhando a bandeira comunista da foice e do martelo e nem quis saber de deus, foi logo perguntando de seu colega Luís Carlos Prestes, outro comunista e ateu.
Porém, Niemeyer nem imaginava o que lhe aguardava. Foi recepcionado por um coral de anjos que, convocados de emergência pela santíssima trindade e muito bem ensaiados e afinados, executaram a Internacional (célebre hino comunista) à sua chegada. Sopranos, tenores e baixos, com seus mil instrumentos, entoaram louvores ao arquiteto. Pintores, poetas, abraçando os escritores numa festa sem igual.
E deus, mui feliz, disse : entre aqui, Niemeyer, no céu você tem lugar.
O pequeno relato acima, digno de uma viagem de LSD, é a versão do pastor luterano Mozart Noronha sobre a chegada de Niemeyer ao céu.
Mozart Noronha foi um dos quatro sacerdotes que celebraram o culto ecumênico em homenagem ao arquiteto, no último 7 de dezembro, no cemitério São João Batista, Rio de Janeiro. Além dele, dois padres e um rabino compuham o desrespeitoso e canalha quarteto. Desrespeitoso, sim. O sujeito era ateu declarado. Morre e logo vem a urubuzada de plantão, os mercadores de alma, cada um querendo atribuir a seu deus um quinhão da genialidade genuinamente humana e racional de Niemeyer. Porque é disso que esses pulhas gostam, atribuir a genialidade alheia aos seus deuses; melhor,  que o próprio sujeito diga que sua inspiração vem do todo-poderoso, que seu talento é um dom divino, e que, principalmente, agradeça de joelhos e encha os cofres das igrejas. 
Ainda mais num país feito o Brasil, onde impera a cultura do coitadinho, onde a maioria só "progride" às custas de assistencialismo barato, onde receber esmolas e rezar tomou, há tempos, o lugar do trabalho, do esforço, do estudo, enfim, do aperfeiçoamento pessoal. Num país em que a palavra meritocracia é palavrão, incomoda muito a existência de um gênio ateu.
Ninguém aqui nesses tristes trópicos associa uma capacidade acima da média ao estudo, à perseverança, e ao DNA. Talento no Brasil? Só pode ser sorte, ou por deus. Já dizia Tom Jobim, no Brasil, sucesso é ofensa pessoal.
Oscar Niemeyer é o contraexemplo perfeito disso. Ele é uma das evidências mais concretas do nível de excelência que um ser humano pode atingir quando, justamente, se livra de deus e misticismos congêneres. Ele é uma das evidências mais gritantes do quanto o cérebro humano, livre de lendas e mitos castradores, pode se desenvolver.
O padre Jorge Luis Neve da Silva, o Jorjão, outro integrante do quarteto canalha, seguindo bem essa linha da preguiça nacional, declarou : "Niemeyer devia ter “alguma fé” por ser um “homem iluminado”. É uma filhadaputice só. E continua :  "Niemeyer não podia ser um homem sem fé, por ter construído tantas casas de deus", referindo-se talvez às igrejas e catedrais projetadas pelo arquiteto. Neimeyer não projetava igrejas, ele projetava prédios, a utilização dada a esses prédios não era problema dele, nem de seu interesse, ele projetava,  pouco lhe importava a merda que se ia fazer com aquilo.
Fosse deus a dar tantas luzes a Niemeyer, o senhor, padre Jorjão, puxa-saco e lambe-bolas do todo-poderoso, deveria ser um gênio ainda muito maior, o que, pelas declarações dadas, já vimos que não confere. E o que dizer, então, dos seus paroquianos, todos recitadores de ladainhas e tementes a deus? Fosse deus a dar tantas luzes a Neimeyer, o senhor não seria um padre a comandar uma igreja, o senhor seria o reitor de Harvard, Oxford etc.
Neimeyer era ateu, seus padres, pastores e rabinos canalhas! Ateu! É difícil entender isso? Queriam prestar uma homenagem a ele? Ficassem em suas igrejas, ficassem quietos, calassem as putas de suas bocas. 
E para encerrar com chave de ouro a sua participação no funeral, o pastor luterano (e muito louco) Mozart Noronha recitou um poema de sua autoria, o poema que narra a chegada de Neimeyer ao céu. Ei-lo, seguido da foto do pastor:
 Numa tarde de verão,
Dia cinco de dezembro
Do ano dois mil e doze,
Vi a Santíssima Trindade
Reunida de emergência,
Ordenando aos seus apóstolos
Receberem Niemeyer
O incansável guerreiro
Que do Rio de Janeiro
Partiu para a eternidade
Deus estava mui feliz
O espírito nem se fala!
E na comunhão do além
Recomendaram que os anjos
Organizassem um coral
Em homenagem ao arquiteto
Cantando a Internacional.

Logo os músicos reunidos,
Sopranos, baixos e tenores,
Com todos os seus instrumentos
Entoaram uns mil louvores
Externando os sentimentos.

Mil pintores e poetas,
Abraçando os escritores
Numa festa sem igual.
Niemeyer vestia azul,
Com a bandeira vermelha
Segurada à mão esquerda,
Bem como a foice-martelo.
Indagou por Carlos Prestes
E todos os seus companheiros.

Deus que sempre sentiu dores
De um povo pobre e oprimido
Disse: entre aqui, Niemeyer.
No céu você tem lugar.

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