Bukowski, Outra Coisa Boa Perdida Para Sempre

"Quando eu estava a uns dois quarteirões da minha casa, vislumbrei uma mulher dentro de um carro tentando fazer com que ele pegasse, tentando tirá-lo da calçada. ela estava tendo os seus problemas. ele dava uns solavancos para a frente, então afogava. ela virava o arranque imediatamente no que eu imaginava ser uma maneira bastante equivocada e cheia de pânico.
era um modelo antigo, fiquei na esquina observando. logo o carro afogou bem perto de mim, bem ali na calçada onde eu me encontrava parado. olhei para dentro. ali estava sentada essa mulher. estava com sapatos de salto alto, meias longas e escuras, blusa, brincos, anel de  casamento e calcinha. sem saia, apenas essa calcinha cor-de-rosa clara. inalei o ar da manhã.
ela tinha essa cara de mulher velha e essas coxas grandes e lisas de menina. o carro deu um pulo para a frente de novo e afogou de novo. caminhei na sua direção e enfiei minha cabeça pela janela:
“madame, é melhor a senhora estacionar essa coisa. a polícia está bastante ativa nessa hora da manhã. a senhora pode se dar mal.”
“tá legal.”
ela o manobrou na calçada, depois desceu. sob a blusa também havia seios jovens de menina. ali ficou ela com sua calcinha cor-de-rosa e longas meias escuras e salto alto às 6:25 da manhã em Los Angeles. uma cara de 55 anos de idade com um corpo de 18.
“você tem certeza que tá tudo bem?”, disse.
“é claro que tá tudo bem”, disse ela.
“você tem realmente certeza?”, perguntei.
“é claro que eu tenho certeza”, disse ela. então ela se virou e saiu caminhando para longe de mim. eu fiquei ali olhando aquelas nádegas sob aquela luminosidade rosa e justa. estava caminhando para longe de mim, pela rua abaixo entre séries de casas, e ninguém por perto, nem polícia, nem humanos, nem mesmo um pássaro. apenas aquelas jovens nádegas cor-de-rosa balouçantes caminhando para longe de mim. eu estava alto demais para gemer; apenas senti a tristeza devoradora e selvagem de uma outra coisa boa perdida para sempre. não havia pronunciado as palavras certas. não havia pronunciado a combinação correta das palavras, não havia nem mesmo tentado. eu merecia uma tábua de passar roupa, portanto, que diabo, apenas alguma louca andando por aí de calcinha cor-de-rosa às 6 horas da manhã."

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1 Comentários

  1. Bukowski é foda mesmo! Não há como resistir a essa tara de lê-lo foderosamente... só essa coroa mesmo, com sua calcinha rosa...

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