São famosas as cachaças nordestinas que trazem os mais variados exemplares da fauna e flora curtidos em seu interior, em conserva, por assim dizer. Cada aditivo, garantem os produtores, conferem não só um gostinho peculiar como também propriedades terapêuticas e curativas à cachaça, algumas mesmo força e virilidade, contribuem para a paudurescência do bebum.
Tem cachaça com cobra curtida, com caju, com escorpião, com jurubeba, com lagartixa, com casca de jatobá, com lacraia, com casca de ipê roxo, com lagarta do coqueiro, com barbatimão, com caranguejo, e uma infinidade de outras ervas e bichos.
Agora, a população do município pernambucano de Cabrobó, mostrando-se profunda conhecedora da lei da conservação das massas de Lavoisier - na natureza, nada se cria e nada se perde, tudo se transforma -, inova no ramo das cachaças medicinais e lança a, já sucesso de vendas, Pitúconha, um marinado da famosa cachaça da marca Pitú com raízes de maconha em infusão.
O rótulo nem tenta disfarçar o conteúdo, já informa logo de cara : aguardente de cana adoçado com raiz de maconha. Na parte de baixo, obedecendo fielmente aos preceitos do código de defesa do consumidor, lista os ingredientes : destilado fermentado de mosto de cana-de-açúcar e raiz de maconha. E ainda, preocupada com a saúde dos pés inchados, dos pudins de cachaça, tranquiliza seus consumidores : Não contém glúten.
Acontece que a pequena cidade de Cabrobó fica encravada no famoso "Polígono da Maconha", o maior plantation de marijuana do Brasil, quiçá do mundo. Após cada operação policial de erradicação e queima de alguma plantação, os discípulos de Lavoisier entram em ação e dão um destino mais nobre às raízes da planta, que ficam lá, enterradas, abandonadas, uma vez que só a parte aérea dos pés de maconha - caule e folhas - é queimada. As pessoas recolhem as raízes e as vendem para os produtores da Pitúconha, o saco de 30 kg sai por R$ 100,00.
A Pitúconha é comercializada livremente nos pés-sujos de Cabrobó e também pode ser degustada acompanhada de um bom espetinho vendido em carrinhos espalhados pela cidade. O cara vai, come lá um espetinho de gato, ops, de calango, e toma uma talagada da Pitúconha. A dose individual sai por R$ 1,00 e a garrafa, R$ 30,00.
A reportagem da Folha de São Paulo conversou com um servidor público que, para aumentar seus parcos rendimentos, já vende a cachacinha do capeta há 5 anos, ele diz que chega a comercializar 6 garrafas por fim de semana em seu carrinho de espetinhos : “Já virou souvenir. Tem um pessoal do banco que compra de carrada. O
pessoal tem muito interesse de conhecer. Houve até um leilão na capital.
Saiu por R$ 200″, afirma.
Mas, enfim, a cachacinha do capeta é ilegal ? A verdade é que Pitúconha tem colocado a polícia e a justiça numa sinuca de bico, num verdadeiro nó górdio. Segundo a Polícia Federal, ainda não há clareza sobre a situação
legal da bebida. Se a lei fosse levada ao pé da letra, seria crime, porém, uma perícia feita pela PF no ano passado indicou concentrações muito pequenas de THC (tetrahidrocanabinol), o princípio ativo da maconha, nas raízes. “A lei não especifica a quantidade de THC. A questão é de ordem prática:
a concentração é muito pequena. Não existe uma repressão sistematizada
até hoje”, diz o delegado Carlo Correia, chefe da Delegacia de Repressão a Entorpecentes da Polícia Federal em Pernambuco.
E o povo é tão descarado que o delegado conta que as pessoas chegam a pedir raízes de maconha para os policiais envolvidos nas operações, segundo elas, para tratar de dor na coluna, problemas de estômago e asma.
De qualquer forma, caso você vá a turismo à pequena Cabrobó, resolva experimentar sua bebida típica e seja abordado por um policial, basta sair à francesa, ou melhor, a la Bezerra da Silva, é só dizer ao representante da lei : - vou me servir, mas não vou emborcar agora.
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