Competência É Inconstitucional No Brasil

Num raro e excelente exemplo classista, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) impõe um exame aos bacharéis formados em direito. Exame que reprova, muitas vezes, mais de 80% dos inscritos. O cara fica com seu diploma de bacharel, porém impedido de advogar enquanto não passar no exame da ordem.
Isso se faz cada vez mais necessário nos dias de hoje, em que faculdades virtuais proliferam feito bactérias em cultura (no caso dessas faculdades, na falta de cultura). Porque senão fica fácil, o cara se forma em advocacia em qualquer pocilga por aí e sai fazendo seu estrago. Esse belo exemplo, e sempre digo isso, deveria ser estendido a todas as categorias do ensino superior, todas categorias deveriam ter que passar por um exame de sua ordem, do mesmo nível do da OAB. Médicos, dentistas, professores, farmacêuticos, veterinários, fisioterapeutas, economistas...todos, sem exceção.
Mas aqui é Brasil, certo? Aqui o mérito e a distinção são crimes inconstitucionais. Pelo menos, esse é o parecer do juiz federal Vladimir Souza Carvalho, que deu ganho de causa a dois bacharéis de direito, incapazes de passar no exame da ordem, e que resolveram ganhar a coisa no "tapetão".
Os dois bacharéis, já mostrando bem o tipo de advogado que serão, entraram com uma liminar alegando que o exame da ordem fere o tal princípio da isonomia, já que nenhuma outra profissão é submetida a crivo parecido. Para mim, a tal isonomia é o princípio constitucional do canalha. Sempre que alguém recorre à isonomia, é para conseguir, sem labuta, o que outros se esforçaram para.
A OAB vai entrar com recurso contra a decisão do juiz Vladimir Souza Carvalho, e seu presidente, Ophir Cavalcante, diz acreditar que o STF vai julgar o caso e colocar uma pá de cal nesse absurdo. Eu torço para que sim.
Esse princípio da isonomia é a cara do canalha, do encostado. Ele garante que pessoas que exerçam uma mesma função tenham que ser, por exemplo, igualmente pagas. Um funcionário médio e um excelente tem que ganhar a mesma coisa; não se pode pagar muito bem para todos, até porque nem todos merecem, então o que se faz em obediência à isonomia? Paga-se mal a todos, inclusive ao bom. Conheço diversos casos, sobretudo no serviço público, de pessoas muito capazes e bem-intencionadas que, ao longo do tempo, simplesmente cansaram, "largaram mão" da coisa. Já que sempre igualadas aos ineptos, ineptos também se tornaram e, hoje, não rendem nem fração do que poderiam se tivessem tido uma distinção profissional; eles passaram também a aplicar o princípio da isonomia : iguais salários, iguais esforços, produção e trabalho, ora pois. Muito justo, do ponto de vista de nossa constituição.
Outro belo exemplo de uma tentativa de valorizar o mérito foi dado pelo governador José Serra (SP), no início desse ano. Promoveu uma prova de mérito para a classe professoral com acréscimo de salário de 25% aos aprovados. A APEOESP foi a primeira a ser contra. Óbvio, dada a qualidade dos que compõem seus quadros. Mas a prova aconteceu e 20% dos professores do estado ganharam seu aumento. Se a prova teve critérios justos ou não, se bem avaliou os candidatos ou não, é uma outra questão. Passível, inclusive, de muita discussão e ajustes para as próximas, mas a ideia do mérito não pode ser condenada.
Agora, correm rumores de que o novo governador, Geraldo Alckmin, apesar de ser do mesmo partido de Serra, não gostou da tal prova e pretende retirar o aumento dado aos que nela lograram êxito. Creio na impossibilidade da retirada do aumento, uma vez que ele foi incorporado ao salário-base, se ele tivesse vindo na forma de gratificação, até poderia acontecer. Outros rumores afirmam que, então, o mesmo Alckmin, em nome da isonomia, dará o aumento para todos os outros, independente de terem realizado a prova ou terem sido nela aprovados. É possível. E provável, infelizmente. Depois, ninguém sabe por que o bom deixa de se atualizar, de fazer cursos, de preparar uma boa aula, ninguém sabe por que ele começa a só cumprir tabela.
Enquanto a regra nos países desenvolvidos é incentivar o aprimoramento pessoal com base na premiação e distinção frente aos da categoria, é crime ser competente no Brasil. Você é competente? Azar seu. Deixe-o de ser e pare de reclamar. É o que venho fazendo, ou tentando.
Torço para que realmente essas duas ações desobrigando a realização do exame da OAB sejam vistas como piadas de mau-gosto e enterradas bem fundo nos arquivos mortos de nosso sistema judicial. Mais, torço mesmo, quero acreditar que, um dia, exames semelhantes, de mesma honestidade e nível, sejam obrigatórios para todas as profissões de nível superior. Mas não sei, não...

Postar um comentário

0 Comentários