Escolas-Coliseu

Via de regra, ninguém gosta de se sentir obrigado a algo. Mas por que nos sentimos obrigados a certas tarefas e não a outras? Acredito que nos sintamos forçados por ocasião do realizar de uma tarefa cuja execução nos é penosa, difícil, aviltante em alguns casos na nossa concepção; quando um encargo nos é leve e fluido, deixa até de ser obrigação - torna-se diversão, prazer.
E por que algumas atividades nos torturam enquanto que outras inclusive nos reconfortam? Essa resposta é fácil. Vem da habilidade natural de cada um, aquela aptidão inata programada em nosso chip, o DNA. Se temos o dom para algo, é prazer; senão é obrigação, aporrinhação.Por isso, sou a favor de que sejamos, dosadamente, obrigados a trabalhos que não caibam em nossos talentos congênitos.
Eu sou canhoto, nasci assim. Da minha primeira até minha terceira série primária, fui obrigado pela escola a treinar também a escrita destra. Preenchi um sem-número de cadernos de caligrafia às custas das contorções quase epilépticas de minha desajeitada mão direita. E cheguei a adquirir uma grafia destra bastante compreensível. A partir da quarta série, eu com meus 10 anos de idade, não se falou mais do uso de minha mão direita. Era o ano de 1977 e, acho, as novas peidagogias - os Skinners e behavioristas da vida - começavam a se infiltrar no tecido sadio da educação e, lentamente, iniciar sua gangrena gasosa : fui liberado do uso de minha "destreza".
Gostei disso na época, claro que gostei. Hoje - e já há muito, muito tempo - não restou nada da habilidade de escrita conquistada por minha mão direita, mas percebo que sou mais hábil que a maioria dos canhotos em várias atividades com minha mão direita; desde o manuseio do abridor de latas ao do mouse do computador. Essa minha literal destreza maior não teria vindo da obrigação a que fui submetido? Claro que sim.
E só disse de habilidades motoras até então. Só que habilidades motoras são meramente resultados de novas vias inauguradas no cérebro. Quantas novas estradas, em meu córtex cerebral, não foram terraplanadas, asfaltadas, iluminadas, sinalizadas e postas em condições de tráfego pelo simples fato de eu ter sido obrigado ao uso de minha mão direita?
Quantas eclusas não me foram abertas pela "intransigência" de um modelo de Escola dito massacrante e antipedagógico pelas peidagogias atuais e vigentes?
Em quanto não devo esse meu Q.I. notadamente superior à média ao autoritarismo de minhas tacanhas e paquidérmicas "tias" do primário? Quantas novas rotas de pensamento não se acenderam para mim? 
Muitas, tenho certeza de que muitas. Forçar o corpo é exercitar a mente; escravizar o corpo é alforriar a mente. Por mais essa razão, abaixo a peidagogia que preconiza apenasmente (como diria Odorico Paraguaçu) a valorização da bagagem pregressa do aluno, abaixo a peidagogia que "respeita" as habilidades e competências naturais e cotidianas do educando; o cotidiano e o senso comum que vão às putas que os pariram!
Quero o retorno à verdadeira Educação. Aquela que confrontava o aluno com suas inabilidades e incompetências em um gládio de morte, quero que a Escola volte a ser um coliseu. Se os leões vencerem, paciência. 
No meu caso, arranquei-lhes as jubas.

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