O Poeta Sórdido

Sobre meu poema "Os Abnegados", JB, meu amigo e quase ermitão do Blogson Crusoe, com quem, um dia, ainda tomarei uma cerveja pessoalmente (essa é um do itens de minha lista das coisas que quero fazer antes de morrer), mesmo que ele tome uma sem álcool, comentou :
"Você criou fantásticas imagens neste poema. A do Don Juan e a do vampiro são geniais. Eu só não entendo uma coisa em você. Você parece ter uma compulsão de escandalizar, de chutar o pau da barraca. É como se estivesse em alguma festa, todo bem vestido. Aí, no finalzinho, dá aquela vomitada na própria roupa. Bom, o poema é seu e eu sou uma besta de explicitar minha visão, pois não sou crítico literário nem de revistinha da Mônica."
Bom, devo dizer que, isso de vomitar na própria roupa ao fim da festa, já o fiz muita vezes, e no sentido literal mesmo, não no figurado. Em relação ao sentido figurado, creio que JB se refira ao meu gran finale, em que comparo o abstêmio que bebe escondido da família com o adolescente que toca uma bronha escondido da mãe e de Deus.
JB não gosta nem tampouco se sente à vontade com palavrões. Ele é uma quase Marcela Temer, a bela, recatada e do lar. JB é recatado e do lar.
Sim, acho que tenho mesmo essa compulsão, ou essa necessidade, de escandalizar. Se não for pra causar espanto, choque ou desconforto, prefiro ficar quieto. Isso, claro, é um traço latente de minha índole, nasci assim, mas que, acredito, tenha sido intensificado pela leitura de um de meus autores preferidos, Manuel Bandeira, e, mais em particular e fortemente, por um de seus poemas, o Nova Poética.

Nova Poética
Vou lançar a teoria do poeta sórdido.
Poeta sórdido:
Aquele em cuja poesia há a marca suja da vida.
Vai um sujeito.
Sai um sujeito de casa com a roupa de brim branco muito bem engomada, e na primeira esquina passa um caminhão, salpica-lhe o paletó ou a calça de uma nódoa de lama:
É a vida.

O poema deve ser como a nódoa no brim:
Fazer o leitor satisfeito de si dar o desespero.
Sei que a poesia é também orvalho.
Mas este fica para as menininhas, as estrelas alfa, as virgens cem por cento e as amadas que envelheceram sem maldade.

Assino embaixo do que diz o Bandeira, e emborco um licencioso trago de rum para reconhecer firma. O poema, o bom poema, de ser como a lama no brim, na roupa limpa, deve tirar o sujeito do sério, do lugar comum. Do orvalho, das estrelas alfas, das virgens cem por cento e das amadas que envelheceram sem maldade há, aos montes, quem já cuide : psicólogos, terapeutas, padres confessores, "escritores" de livros de autoajuda etc.
Para jogar a necessária merda no ventilador, a necessária lama no brim, poucos. O Bandeira e, modestamente, sem jamais me colocar no mesmo patamar de qualidade, só no de mesma função, eu, o Azarão, essa criatura abominável que vos fala.

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