Pastel de Feira : A Minha Comida Japonesa Preferida

Há cerca de uma década - possivelmente um pouco menos -, de um lustro - possivelmente um pouco mais -, a cidade de Ribeirão Preto foi tomada por uma profusão de restaurantes de culinária japonesa. Só no bairro em que resido, contei oito; num trecho de pouco mais de dois quarteirões de uma rua no centro da cidade por onde passo a caminho do trabalho, mais quatro; nas páginas amarelas da lista telefônica, parei de contar quando cheguei aos cinquenta. Uma verdadeira invasão dos sabores do Sol Nascente. Um Pearl Harbor de sushis, sashimis, tempuras, shoyus e outras bombas de sódio.
Minha esposa adora comida japonesa; eu como, não é minha preferida, mas eu como, afinal, japonesa eu como de qualquer jeito. Só que não! Só que não é culinária japonesa porra nenhuma! Desafio qualquer um a encontrar um japonês no comando da cozinha de um restaraurante japonês - pelo menos aqui em Ribeirão, e acredito que isso seja extensivo ao estado de SP no geral.
Não há um único par de olhinhos puxados a fatiar postas de salmão ou a enrolar algas em rolinhos de arroz, não há um só súdito de Hirohito. Só tem cabra da peste! A culinária japonesa foi encampada, expatriou-se e naturalizou-se nordestina. Tem muito mais nordestino destrinchando e fatiando salmão e atum que fazendo sarapatel ou costurando bucho de bode. E com destreza até superior à do japonês.
Não é de surpreender. Na falta dos lendários samurais, cujos descendentes poderiam transferir a habilidade no manejo da katana de seus ancestrais para o corte de peixe e à extração cirúrgica da glândula de veneno do baiacu, temos o não menos lendário Virgulino Ferreira, o Lampião, cujos descendentes transpuseram a perícia, a ligeireza e a malandragem do manejo da peixeira, a katana da caatinga, de seus ancestrais para a precisão e a delicadeza necessárias à culinária japonesa, e dela se apropriaram. Aliás, eu duvido que algum samurai conseguisse enfrentar um ás da peixeira e sair da contenda com as tripas dentro do bucho.
Então, não há, Azarão, alguém poderá perguntar, no Brasil, a autêntica cozinha japonesa? Sim. Há. A genuína cozinha japonesa ainda resiste bravamente num último front gastronômico, num último xogunato de opsofagia : as barracas de pastel das feiras livres! O pastel de feira é a verdadeira comida japonesa. E é a minha preferida - claro que a Sabrina Satto também viria bem a calhar e seria muito bem-vinda.
Faço agora o desafio inverso : andem pelas feiras livres de SP e tentem encontrar uma única barraca de pastel que não seja chefiada por um japonês. Inclusive, eu suspeito que exista uma espécie de CRJ - um Conselho Regional de Japonês -, que obrigue a presença de pelo menos um japonês em cada barraca de pastel; o dono da barraca pode nem ser oriental, mas para obter alvará de funcionamento etc tem que pôr um japonês lá, tem que contratar um. Feito são obrigatórias, a exemplos, a presença de um farmacêutico em uma farmácia, imposta pelo CRF, mesmo que ela seja alopática e só venda às vistas de receita médica, ou a de um veterinário, conquista do CRV, em todo pet shop, ainda que lá só se venda ração, xampu e se ofereça apenas serviços de banho e tosa.
Desde já, fica a dica do Marreta para os machos que me leem : quando você estiver com o filme queimado com a digníssima esposa etc, quando a coisa não estiver boa para o seu lado, surpreenda sua companheira e limpe a sua barra, chegue pra ela e diga que vai levá-la para comer uma comida japonesa. Ela vai ficar toda empolgada, primeiro porque é moda e mulher adora moda, segundo porque restaurante japonês é caro pra caralho e mulher gosta de coisa cara, o gosto pode ser uma bosta, mas se for caro, ela come e lambe os beiços. Aí, você pega e a leva para comer um pastel na feira. Sai muito mais barato, meu amigo.
Quando estou de férias, levo sempre meu filho para comermos um belo dum pastel numa feira livre próxima de nossa casa. Há quatro barracas de pastel nessa feira, e eu já experimentei as quatro, sendo que a melhor é a mais modesta delas, uma que fica bem num dos extremos da feira, quase sem nenhum movimento, com uma japonesa e sua filha no atendimento. Excelentes pastéis. Sequinhos. Genorosos recheios. Há os clássicos e indefectíveis de carne e de queijo e também outros sabores menos usuais. Um muito bom de calabresa acebolada, um apetitoso de escarola e bacon e o insuperável e imbatível pastel de bacalhau. 
Uma delícia o bacalhau da japonesa. Molhado e suculento sem ser empapado; salgadinho na medida certa. Tem vezes que vem até com uns pentelhos no meio!
Pããããta que o pariu!!!!!
Pastel de feira, garantido, né?

Postar um comentário

5 Comentários

  1. texto muito legal, com a assinatura inconfundível do Marreta no último parágrafo.

    ResponderExcluir
  2. É a sacanagem contida em "Uma delícia o bacalhau da japonesa. Molhado e suculento sem ser empapado; salgadinho na medida certa. Tem vezes que vem até com uns pentelhos no meio!"

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. É que você não conhece o bacalhau da japa...
      Mas pelo comentário, você deve ser ou mulher ou algum metrossexual, certo?

      Excluir