Quero feder à heresia
A esgoto lançado ao mar
E assim devo me deixar.
Já que não sou mesmo de nenhuma utilidade
Pra que toda essa limpeza,
Toda essa vaidade?
Nada mais de polir a casca
E o interior a se desmanchar.
Que se igualem, pois, os dois
Que seja tudo única sujeira
Um único queloide.
Já que não tenho mesmo nenhuma serventia
Pra que tanto zelo,
Tanta assepsia?
Nada mais de semblante amável
E um coração que só sabe odiar.
Serei completo ódio
E darei estetoscópios ao mundo
Pra que ninguém deixe de meu ódio escutar.
Já que não sirvo mesmo pra nada
Pra que desalojar a imundície,
Por que não deixar o sebo criar camada?
Nem a remela dos olhos, hoje, vou tirar
Vou deixar minha fedentina
Qual grudenta serpentina
Em seu perfume do Boticário se enroscar.
Deixar-me criar fungo
Crescer craca no dorso
Leucemia em tudo que é osso
Raspar essa minha pele de carnaval.
E já que não sou mesmo de nenhuma função
Pra que tanta higiene,
Tanta dedetização?
E esperar...
Um motivo,
Uma necessidade,
Uma vida,
Uma nova era glacial.
3 Comentários
Esse poema vai me obrigar a postar um texto que escrevi há quatro anos, quando já estava com 61 anos, mas ainda sob os efeitos de ter chegado aos cinquenta. O que você disse no poema tem muito da perplexidade, inquietação e revolta que senti ao me "descobrir" no espelho, um legítimo "tiozinho". Envelhecer, sentir-se velho é foda, my friend.
ResponderExcluirpois publique o texto ainda hoje, já que resolveu coçar o saco a semana inteira e só trabalhar nas sextas.
ExcluirComo disse no blog, estou fazendo uma reserva de textos para manter o blog na web por mais um ano, se me entende a referência. Se a inspiração ou o saco acabar, ainda terei gás para alugar vocês um pouco. E, se resolver (depois de um ano) não mais postar nada, ainda assim deixarei o blog na web. Morto, mas disponível (se entende o que quero dizer). Só extinguiria o blog se pretendesse publicar o que já escrevi. De outra forma, não. Por isso, tenha paciência.
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