Cristo do Cu Oco

Uma cápsula do tempo é um recipiente destinado a armazenar informações de uma determinada época e concebido com o intuito de que possa ser encontrado, aberto e decifrado pelas gerações futuras - mais um indício do medo patológico que o ser humano tem da morte, outra tentativa de se eternizar no planeta, um retrato da pretensão humana em pensar que sua vida é mais significativa para o Universo que a de um inseto, a de uma ameba, a de um meteoro que se consome e se vaporiza em brilho, a de uma subpartícula com um nanossegundo de prazo entre o primeiro choro e o último suspiro.
As cápsulas do tempo podem ser intencionais, as fabricadas por seres humanos, ou não intencionais, as fabricadas pela natureza, classificadas, nesse caso, em paleontológicas - um fóssil, por exemplo - e arqueológicas - vestígios de antigas civilizações extintas, como a de Pompeia que foi soterrada e preservada pelas cinzas incandescentes do vulcão Vesúvio.
A primeira cápsula de tempo de que tomei conhecimento, uma intencional, e que muito me impressionou à época, foi através de um velho livro de história do colegial. A empresa estadunidense Westinghouse, para dar mostras e provas da qualidade de seus produtos, criou um artefato feito de uma liga de níquel e prata com propriedades semelhantes às do aço leve e com uma durabilidade infinitamente maior, segundo a empresa. A cápsula foi enterrrada como parte do evento Exposição Mundial de Nova Iorque de 1939 e tem sua "exumação" prevista para o ano de 6965, ocasião na qual, garante a empresa, o artefato estará intacto. Seu conteúdo consta de prosaicismos : um carretel de linha e uma boneca, um livro que descrevia a cápsula e os engenheiros responsáveis por sua criação, um frasco de sementes de culturas de alimentos básicos, um microscópio e um microfilme com instruções para uma possível reprodução futura do material gravado.
A agência espacial americana, a Nasa, também tem várias cápsulas do tempo "enterradas" no espaço sideral, a Voyager e as Pioneer 10 e 11, carregando informações que o americano considera relevantes sobre o ser humano e suas civilizações.
Não é preciso, no entanto, acesso à altas tecnologias para fazer a sua cápsula do tempo, para deixar seu recado e seu imprescíndivel legado para as gerações futuras. Praticamente qualquer coisa pode ser reutilizada e convertida em uma cápsula do tempo. Um garrafa, uma mala velha, uma caixa de sapatos, uma lata de tinta ou de leite em pó, um cofre, o fundo falso de uma gaveta. Ou, um blog. O Marreta mesmo, embora não tenha havido (e nem haja agora) a intenção de, não deixa de ser uma cápsula do tempo. A maioria das pessoas, contudo, espalha suas cápsulas do tempo pelo planeta na forma de filhos - as proles são cápsulas do tempo com informação sobre o DNA das espécies.
E se você fosse um padre espanhol do século XVIII e quisesse esconder uma mensagem secreta destinada às futuras gerações? O que usaria como sua cápsula do tempo? Algum dos objetos litúrgicos, um cálice, um turíbulo, uma galheta, uma âmbula? Pouco prudente. Confeccionados, muitos deles, com metais nobres, sempre foram alvo da cobiça de ladrões e a cápsula do tempo do padre teria duração por demais efêmera. O mais provável é que o padre escondesse as revelações de sua época ou num compartimento oculto no altar, ou num nicho de difícil acesso da arquitetura da igreja, ou ainda dentro do oco de alguma imagem feita de gesso, madeira ou cerâmica.
Uma imagem sagrada, uma estátua de madeira representando Jesus Cristo, foi o recepiente usado por Joaquín Mínguez, capelão da catedral do Burgo de Osma, em 1777, como sua cápsula do tempo, o receptáculo no qual o religioso acondicionou um manuscrito de sua autoria e o remeteu para o futuro.
A descoberta se deu por acaso, por uma empresa de restauração que estava a dar um trato, uma guaribada na estátua de nome Cristo del Miserere e despertou a atenção de historiadores.
A maior surpresa nem se deu exatamente pela descoberta do manuscrito, afinal, como afirma Efrén Arroyo, historiador e membro da Fraternidade da Semana Santa de Sotillo de la Ribeira, não chega a ser incomum a descoberta de documentos escondidos em velhas estátuas religiosas. O espanto se deu pelo inusitado da localização do documento : Joaquín Minguéz ocultou o seu manuscrito na bunda de Jesus, no fiofó do Nazareno, lá onde o sol não bate.
Pããããããta que o pariu!!! Isso nem é mais uma cápsula do tempo. É um supositório do tempo!!!!
Eu já tinha ouvido falar em santo do pau oco. Em Cristo do Cu Oco, é a primeira vez.
E o que contêm os manuscritos do capelão? Que informações aterradoras e hacatômbicas justificariam a violação da dignidade e da hombridade do Filho de Deus? Que segredos de tais gravidade e relevância mereceriam ser guardados assim, a sete pregas? O sentido da vida? Revelações pré e pós-apocalípticas? O nome do Anticristo?
Nada disso. O fiofó do Cristo rodou por nada, por bobagens, trivialidades. Os manuscritos trazem o nome do escultor da estátua, o nome do rei de então, Carlos III, as culturas agrícolas da região (trigo, centeio, cevada, uva), as doenças mais comuns da época (como malária e febre tifoide), os entretenimentos mais populares (carteados, jogos de bola e jogos de bar) e outros fatos do cotidiano. O objetivo do padre não foi revelar segredos ocultos do Cristianismo, só deixar um instantâneo de seu tempo para a posteridade. E enfiou tudo no cu de Cristo.
Primeiro, Cristo foi traído por seu amigo, humilhado e chicoteado em via pública e morto por crucificação ao lado de ladrões; agora, Cristo é arrombado, tem suas pregas rompidas. E tem cristão que ainda espera a volta do Filho de Deus, que acredita em seu retorno.
Sei não, mas eu, no lugar dele, não voltava nunca mais. Passaria longe desse planetinha de merda. E com a bunda virada pro lado do Sol.
Pããããããããta que o pariu!!!

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1 Comentários

  1. Sem contar os que falam e fecham (ótimos) negócios em nome dele sem ao menos uma procuraçãozinha reconhecida.
    Cássio - Recife/PE

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