Instantâneos da Alma

I) MINHA INDIRIGÍVEL ALMA ZEPELLIN 
Sei exatamente o que não devo fazer... 
Mas fazê-lo, 
Irreprimível e sem zelo, 
Gaseifica, acopla flutuadores de hélio: 
Faz um bem danado para a minha alma. 

II) ENTENDA-SE 
Você me adora. 
Você não confia em mim. 
Você não tem motivos para nenhuma das duas coisas.  

III) UM CARA CHATO E CINZA 
Primeiro foi-se a vodka, o rum 
(“esses destilados arruínam a gente”, impõe a mulher). 
Nunca mais sangue pirata ebulindo nas veias 
Nem o hálito adstringente de Natasha
Depois foram-se as madrugadas 
(“pouco sono até baixa a resistência”, recomenda a mulher). 
Nunca mais a contemplação do escuro calmo 
Nem os pensamentos extraídos pela força dos buracos negros.
Foram-se, por fim, as raras reuniões com os amigos 
(“blá-blá-blá, blá-blá-blá, blá-blá-blá”) 
Nunca mais passar da conta, 
Nunca mais passar da hora, 
Nunca mais faxinar a alma. 
E chega lá um belo dia 
- Instintos domados e quereres ausentes – 
Ainda se tem que ouvir da mulher: 
“Que cara chato e cinza você é !” 

IV) QUEM SABE APRENDENDO RUSSO OU MANDARIM 
Como explicar 
(Quem sabe aprendendo russo ou mandarim) 
Que minha alma, sim, é minha, 
Mas que às vezes expectora-se, salta de mim? 
Como explicar 
(Quem sabe búlgaro ou língua sarracena) 
Que minha alma, sim, é terrena, 
Arrasta-se por buracos, tropeça em pedras, 
Mas que às vezes limpa a lama das solas 
E voa-se de mim, voa plena? 
Mais difícil ainda explicar e fazer crer 
(Fazer crer é o pior) 
Que quando voa, minha alma voa só, 
Só por voar. 
Voa sem o propósito de ofender ninguém. 
Mas ofende : 
Pela sua capacidade de voar.

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