Tristeza Não Tem Fim

Quero espalhar minha tristeza 
Pelas ruas, casas e fígados 
Fazer dela um novo gás na atmosfera. 
Quero difundir minha tristeza. 
Aspergí-la em espirros: 
Gotículas de muco melancólico 
A salpicar as faces alegres 
(ou burras demais para perceberem que tristes deveriam ser), 
A tornar densas as salas de cinemas, 
A umidificar os bolos de aniversário. 
Exibí-la em gêiseres de urina: 
Chovendo da janela do apartamento sobre os passantes, 
Regando jardins e praças públicas, 
Pichando, na madrugada, dizeres obscenos nos muros. 
Torná-la em campos minados de matéria fecal: 
Pacotes mal-educados a ofender olfatos e fingidas sensibilidades, 
A competir territórios com os vira-latas do bairro, 
A dificultar caminhos e emplastrar as solas dos sapatos.

Quem dera minha tristeza pudesse ser expressa por essas vias. 
Quem dera, por essas vias, minha tristeza ser compreendida. 
Para dizer da tristeza só se permitem as palavras 
E umas poucas e inócuas lágrimas. 
Obstáculo: as lágrimas podem ser tomadas como falsas, e infalivelmente o são. 
Obstante: inodoras, assépticas e anêmicas são as palavras do vernáculo que eu conheço]

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