Um Pouco de Beleza, Para Variar (2)

A luta contra a depressão, a ansiedade crônica e o pânico (acrescidos, agora, por Burnout, como fui informado em minha última consulta) é uma briga de caráter exclusivamente íntimo.
Embora sejam desencadeados e potencializados por fatores externos - no meu caso, a extensa convivência com o que há cada vez mais de pior do ser humano, ou pior ainda, do pior que há do brasileiro, inclusive na net, onde eu estava livre da gentalha até pouco tempo -, a batalha diária contra eles é interna.
Dá-se unicamente na nossa própria mente, entre as quatro paredes do nosso crânio. É a guerra travada por um exército de um homem só contra esse mesmo exército de um homem só. Em suma, uma loucura. Literalmente.
É uma guerra sem tréguas, sem intervalos nem para tomar um cafezinho. Mesmo quando, aparentemente, estou conseguindo me concentrar em alguma atividade - uma leitura, um filme, cozinhando, ou seja lá o que for -, ela continua lá, como um zumbido de fundo, como estática em estação de rádio, feito imagem fantasma em figuras da TV. Não há botão de on/off para ela. No máximo, nos melhores dias, o de stand by.
Não é de se espantar, portanto, que esse eterno estado de litígio interior provoque em nós, que somos iguais em desgraça (como disse a desvairada Cazuza), um alheamento da realidade que nos cerca. Não raras vezes, estou a ver um filme e tenho que pausar e retrocedê-lo um tanto; ainda que não esteja a cochilar no sofá, ainda que esteja de olhos bem abertos e a mirar a tela, eu abstraio o externo, encaramujo-me, muitas vezes sem pensar em nada, apenas isolo-me, inconscientemente. Também não raro, desculpo-me com a esposa e peço que ela repita o que acabara de me dizer ou pedir.
Tal é o meu atual grau de alheamento que ele quase me fez perder um dos curtos períodos do ano de que mais gosto, quase me fez cometer a indelicadeza de ignorar, deixar passar despercebido e não prestar a devida reverência a um dos maiores espetáculos da natureza : a florada do ipê-roxo.


Dentre os inúmeros prodígios da natureza, a flor é a sua obra suprema, uma obra inigualável de engenharia. Sempre achei isso - como já expus na postagem A Arquitetura da Flor - e continuo a achar. A flor é o órgão sexual das plantas angiospermas, é a bucetinha cheia de néctar das árvores. Nada lhe é mais belo. A florada é a árvore em pleno cio.
No ipê-roxo, então, ela é um deslumbre. Impressiona não apenas pela beleza intrínseca à sua flor, mas também pela generosidade com que ele as nos oferta, pela copiosidade de beleza que o ipê florido é.
A orquídea, por exemplo, aliás, planta que eu acho das mais sem graças, até produz lá uma, duas, três ou quatro belas flores. Aí, fica "fácil", dá pra caprichar mais em cada uma delas. Quero ver é fabricá-las aos milhares.


Qual ipê eu acho o mais bonito? Aí, depende. Quando é o roxo a florir, o roxo; quando o amarelo, o amarelo; quando o branco, o branco e quando o rosa, o rosa. Contudo, talvez, o roxo, seguido pelo amarelo, seja o que atinja o maior porte e me impressione mais, justamente por suas dimensões.
Esse das fotos fica a alguns quarteirões de casa e, erros de paralaxe à parte, comparando sua altura com um prédio de apartamentos que fica atrás dele e um quarteirão acima, estimo que ela esteja entre os 15 e 20 metros. Sua idade, na certa, ultrapassa os cinquenta anos, pois eu era um moleque de uns 7 ou 8 anos quando passava por ali rumo à escola, e ele já floria.
Existem cerca de 250 mil espécies de angiospermas (plantas que produzem semente, flor e frutos) distribuídas por todo o planeta e, apesar de ser um assunto do qual muito gosto, de ter vários livros sobre e tal, sei que não devo conhecer nem 1% desse total. 
Ainda assim, leviano que sou, duvido que haja outra árvore no planeta com florada tão bela. Duvido.


Bonito pra cacete, né?

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2 Comentários

  1. Quem não padece de Burnout hj em dia? Acho q até eu.
    Onde moro, reinam os ipês amarelo. Tb não canso de olhá-los.
    Abç

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