Planeta Macho (2)

Antigamente, a aspiração de todo menino era se tornar um homem, um adulto de barba na cara e pelos no saco. Seguir os mesmos passos, adotar os mesmos valores e símbolos de masculinidade de seu pai e avôs. ( E não o avesso que hoje se nos apresenta, adultos e senhores de meia-idade vestidos e travestidos em trajes, modos e ares de garotões, mas isso já é outra história e hoje eu não quero me aborrecer).
Conforme o menino ia crescendo e fazendo por merecer e mostrando-se mais responsável, ele ia ganhando presentes, de seu pai, tios, padrinhos e avôs, que eram os imprescindíveis apetrechos a um macho das antigas. Gradativamente, o menino ia recebendo e tendo de arcar com cada vez mais responsabilidades de um adulto e, paralelo a isso, ia sendo também paramentado como um. O menino virava homem por dentro e por fora.
A uma certa idade, o menino ganhava um cinto de couro, por exemplo, para afivelar as suas também recém-conquistadas calças compridas. Mais para a frente, ganhava um conjunto de três lenços Presidente, para levá-los ao bolso traseiro da calça, feito o avô. Daí a pouco, um relógio de pulso do padrinho. Não demorava muito e ganhava um pente plástico Flamengo, para ter sempre ao outro bolso traseiro da calça e manter os cabelos emplastrados de Trim sempre bem alinhados, igual ao tio materno metido a galã do bairro.
Porém, um dos momentos mais ansiados pelo menino era quando, e finalmente, ele ganharia o símbolo de macheza mais ambicionado por todos : a carteira de couro. Para guardar seu dinheirinho? Até que podia ser, também. Se, eventualmente, ele ganhasse uns trocados, a carteira se prestaria a isso. Mas essa não era a principal e tão aguardada utilidade da carteira. Que dinheiro, que nada. A carteira iria servir para guardar calendários de bolso de mulher pelada! Sim, meus caros, aqueles calendários com gostosas, confeccionados no tamanho aproximado de uma carta de baralho.
Ser presenteado com uma carteira de couro, deixava subentendido que o menino receberia junto alguns calendários de mulher pelada. A ambição pela posse de uma carteira era impulsionada por um cobiça ainda maior, era motivada pela conquista do símbolo máximo e definitivo de sua juvenil masculinidade, o calendário de mulher pelada, o atestado da passagem do menino para o homem.
Os calendários de bolso de mulher pelada, tão em voga dos anos 1950 aos 1980, não tinham apenas as funções decorativa e punhetativa. Foram, durante muito tempo, importantes e eficazes ferramentas de propaganda e divulgação de produtos e serviços. Eram distribuídos à guisa de brindes, para fazer um agrado e fidelizar o público masculino da época.
Os mais diversos e variados setores da indústria, comércio e prestação de serviços vinculavam seus produtos e suas razões sociais a belos pares de peitos, a roliças coxas e a suculentas bundas lisinhas e xavascas peludonas.
Imprimiam-nos e distribuíam-nos : as padarias, os armazéns de secos e molhados, os postos de gasolina, os bares e lanchonetes, os escritórios de contabilidade, as farmácias, as quitandas, os depósitos de materiais de construção, as papelarias, os armarinhos, os salões de barbearia, as sapatarias, as alfaiatarias etc etc.
Os calendários de bolso de mulher pelada eram verdadeiros mini-outdoors (ou indoors, nesse caso?) publicitários do Planeta Macho.
Não pensem, contudo, que a propaganda disseminada pelos calendários de bolso de mulher pelada ficava restrita a pequenos estabelecimentos comerciais e produtos de fabriquetas de fundo de quintal, que era uma publicidade marginal, condenável e proscrita.
Nada disso. Grandes empresas e conceituadas marcas, muitas existentes até hoje, também estampavam suas logomarcas em calendários de bolso de mulher pelada. Por exemplo, as tintas Coral, uma das gigantes do ramo da pintura residencial, comercial e automotiva.
Praticasse hoje este tipo de publicidade, a Coral seria prontamente taxada de machista, sexista, de objetificar a mulher e seria, imediatamente, "cancelada" pelas patrulhas ideológicas esquerdistas da porra.
Tampouco as modelos que figuravam nos calendários eram putas baratas e bagaceiras catadas à zona do baixo meretrício. Muitas atrizes gostosas de então emprestaram suas desejáveis formas aos calendários de mulher pelada. Por exemplo, a atriz Alcione Mazzeo, que foi esposa de Chico Anysio, neste calendário da Dunlop, empresa fundada por John Boyd Dunlop, ninguém mais ninguém menos que o inventor do pneu como hoje o conhecemos.
Hoje, as feministas suvacudas e muxibentas de plantão a acusariam de traidora do movimento e também a "cancelariam", forçariam a sua demissão pela emissora que a tivesse sob contrato. E a Dunlop não conseguiria mais vender seus pneus nem para carrinhos de supermercado.
Bons e grandes tempos, os dos calendários de bolso de mulher pelada. Tempos mais simples e menos hipócritas. Mais sinceros e práticos. Afinal, do que o macho das antigas gosta? De ver mulher gostosa pelada. E do que a mulher gostosa das antigas gosta? De se mostrar e ser vista pelada pelo macho, de se sentir desejada por ele, de excitá-lo, ou seja, de ter orgulho em cumprir com a sua função biológica. Macho e fêmea. Alguém ainda se lembra deste simples e eficiente arranjo? Desta natural e profícua combinação?
Os calendários de bolso de mulher pelada são fósseis de uma das eras mais gloriosas do Planeta Macho. Do Planeta Macho em toda a sua pujança, virilidade e paudurescência. Antes dele ser atingido pelo asteroide do politicamente correto e da ditadura das "minorias".
No entanto, ainda que deslocados e desgarrados, ainda que destronados e acossados, alguns dinossauros ainda caminham por aí. Caminhamos por aí.

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4 Comentários

  1. Bons tempos, em que bastava para o homem que a mulher fosse simplesmente mulher... Sem piercings, tatuagens, silicone, horas de academia... Nem depilação. Caio de boca num pastel de pelos de boa.

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    1. Somos dois, meu amigo, somos dois! Quem gosta de manga não fica reclamando dos fiapos presos nos dentes. O cara que tem nojinho de uma boa xavasca peluda ou é um pedófilo ou um viadinho mesmo.

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  2. Vim aqui concluir a crônica sobre dias chuvosos e me deparo com esse belo post. Aí me pergunto onde foi parar minha imensa colecão de calendários de mulher pelada, juntada da infância à adolescência...

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    1. Peço desculpas aqui pela demora em postar a sequência do conto; hoje mesmo ainda sai.

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