Preguiça, o Teu Nome é Brasil (Ou : o País-Macunaíma)

Gilberto Freyre é o caralho! Sérgio Buarque de Hollanda é o cacete! Historiadores , sociólogos, antropólogos são as putas que os pariram! Quem melhor captou, sintetizou, aprisionou e deu forma humana à real essência do brasileiro foi o escritor modernista e antropofágico Mário de Andrade, em sua obra Macunaíma.
Macunaíma, o herói sem nenhum caráter, o herói de um povo (no caso, o brasileiro), como foi anunciado por seus irmãos logo ao seu nascimento. Já nasceu grande, foi praticamente cagado pela mãe, que nem se deu ao trabalho de deitar para pari-lo, apenas flexionou as pernas, fez uma força e obrou Macunaíma, cena retratada de forma magistral na adaptação do livro para o cinema, por Joaquim Pedro de Andrade, em 1969.
Macunaíma era mentiroso, hábil em praticar deslealdades, folgado e vagabundo que só, dado apenas às safadezas e aos prazeres carnais. Vivia nas costas dos irmãos - metafórica e literalmente falando, pois não só não trabalhava para comer como também, muitas vezes, os irmãos o transportavam nas costas para lá e para cá. As primeiras palavras de Macunaíma não foram gu-gu, dá-dá, nem mamãe ou papai. Foram : "Ai, que preguiça!". Que se tornaram o seu lema de vida, o seu bordão.
É ou não é a cara esculpida em carrara (ou, para os mais leigos, cuspida e escarrada) do povão brasileiro, da choldra cuja Carta Magna se resume a uma lei, a de Gérson, da patuleia que vota no Lula e no PT?
Preconceito de Mário de Andrade (e meu, também)? Estereótipo? Vejamos.
Um estudo inédito realizado pela Universidade de Stanford (EUA) e publicado na revista Nature mediu a atividade física de pessoas de 46 países. O estudo se baseou em  dados coletados por um tal de aplicativo Argus, que, pelo que entendi, conta o número de passos dados pela pessoa durante a sua rotina diária. O espaço amostral constou de 717.527 usuários do Argus distribuídos proporcionalmente pelos países pesquisados e monitorados por catorze horas diárias durante dez dias.
O resultado - que surpresa, seus filhotes de Macunaíma! - mostra o Brasil na 40ª posição do ranking. Somos o quadragésimo país mais sedentário e moloide dos quarenta e seis analisados.
O campeão da preguiça, que, tenho certeza, logo bateremos, é a Indonésia, e o campeão do vigor físico é Hong Kong, sendo que, dos dez países mais ativos do mundo, cinco são de povos orientais. Como mostra os gráficos abaixo, com a escala expressa em número de passos/dia.
Eu, mesmo agora em férias, tristemente em final delas, dou, no mínimo, considerando a extensão média de um metro por passo, uns 10 mil passos por dia. O brasileiro típico usa o carro até para ir na padaria que fica na esquina da rua em que mora. Preconceito meu e de Mário de Andrade? E a coisa só fica pior.
Se a preguiça do brasileiro, o nosso orgulho nacional, se restringisse apenas ao aspecto físico, a massa não estaria de todo desandada, haveria ainda algum resquício de esperança. Mas é claro que não. A preguiça verde-amarela se mostra ainda mais intensa e arraigada na área mental. Se o brasileiro tem preguiça de andar até a esquina de casa, que dirá de estudar, de passar algumas horas por dia com as vistas e as fuças nas páginas de um bom livro?
Somos dos mais preguiçosos do mundo também no quesito estudo. Ocupamos também as posições mais vergonhosas nos rankings mundiais de educação. O último exame do PISA (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), aplicado em 70 países, que avaliou rudimentos em leitura, matemática e ciências, mostrou o Brasil nas seguintes colocações : 59ª em Leitura, 63ª em Ciências e 66ª em Matemática. Cingapura foi a primeira colocada em leitura, seguida por Hong Kong; Cingapura aparece, de novo, como primeiro lugar em Matemática, seguida de novo por Hong Kong e com o Japão em quinto lugar; tricampeã, Cingapura também é medalha de ouro em Ciências, seguida pelo Japão.
Coincidência que países orientais, como Cingapura, Japão e Hong Kong, sejam os primeiros colocados nos dois rankings, o de atividade física e o de atividade mental? Porra nenhuma! Claro que não! Tudo é disciplina. Mente disciplinada, corpo idem. 
Não digo de frequentar academias, redutos de boiolas e de biscates preocupados apenas em deixar os cus duros. Digo de habituais e rotineiras caminhadas, tanto que o estudo foi feito com base em número de passos. Uma boa caminhada melhora incrivelmente o raciocínio. Não é figura de linguagem nem viadagem dizer que andar areja o cérebro. Areja, mesmo. Literalmente. O coração bombeia mais sangue para o cérebro, mais sangue, mais oxigênio; mais oxigênio, maior atividade celular, melhor o pensamento. 
Acontece direto comigo. Muitas vezes, é durante uma caminhada que uma ideia que estava meio empacada - sem saber como começar a escrevê-la, ou como conclui-la - desembaraça e deslancha, ganha forma e vida, . Ou que ideias novas surgem. Escrevo andando. Quando me sento, é apenas para registrar. É durante minha caminhada ao trabalho que organizo todo o meu dia, que escalono as atividades e obrigações a cumprir, que monto minha programação, sem precisar anotar nada em agenda nem muito menos, o que é a morte total do cérebro, colocar lembretes sonoros no celular, nem tenho essa porra.
Mens sana in corpore sano, já disse Juvenal.
Ou, no caso do País-Macunaíma, mens iners in corpore obesus. Mente preguiçosa em corpo obeso.
Parabéns por mais essa conquista mundial, povinho de merda!

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