Nem Coxinhas Nem Mortadelas : Somos Todos Pamonhas

Férias. Apenas eu, ainda. Minha esposa e filho saem para a lida deles, ela o deixa na escola a caminho do trabalho. Sete. Sete e dez da manhã. Desço com eles até a garagem do prédio, despeço-me, recomendo os habituais cuidados a cada um.
Saio em caminhada. Meu particular e nada místico caminho de Compostela. Perdi 8 kg de fevereiro até agora. Não deixarei que umas férias inúteis e improdutivas - assim como também o é meu trabalho - os traga em retorno.
Na rua, um inverno tropical me recebe com hospitalidade e simpatia, como se eu fosse o visitante em sua casa e não ele um hóspede raro nessa terra de ares do inferno. 12º C, informou-me o televisivo matutino, minutos antes de eu sair. Um ventinho brincalhão - desses de levantar as saias (isso quando as mulheres ainda as usavam) e de eriçar os pelos e de arrepiar a pele ao sussurrar impropriedades aos nossos ouvidos e cafungar em nossas nucas - faz com que a tal e nunca bem explicada sensação térmica chegue, talvez, aos 10º C, não menos. Nem chega a ser frio. Apenas uma delicada forma de calor.
Não  obstante, de tênis, bermuda e camiseta, cruzo com pessoas indo ao trabalho, ou à feira, ou ao mercado, ou à toa feito eu, trajadas como se a um exílio político na Sibéria estivessem a se encaminhar.
Percorro três voltas inteiras em torno de uma avenida situada a seis quarteirões de casa. O circuito completo pela avenida - baseando-me na numeração das casas, prédios e lojas - conta com cerca de três quilômetros. Três voltas; nove quilômetros, portanto. Mais os seis quarteirões para chegar à avenida e os outros seis para voltar para casa e ultrapasso a marca dos dez quilômetros.
(depois, à hora do almoço, mais quatro quilômetros até a escola do filho e mais quatro para voltar; mais à tarde, posto que hoje é quinta-feira, mais um quilômetro e meio até a escola de natação e outro quilômetro e meio de volta, e definitivamente, ao reduto do meu lar. Tudo contabilizado, por baixo, uns vinte quilômetros. Os latões de cerveja, assistindo à sexta temporada do House M.D., descerão leves e sem culpa, absolvidos por álibi irrefutável).
Na avenida, à minha esquerda, a leste no horizonte, um morno e remelento sol de pijamas e pantufas me atinge com seus raios ainda a se espreguiçarem, um afago tépido de amante recém-acordada e com os dentes ainda por escovar.
Passo, então, pela tradicional Panificadora Elite, que, com o tempo, tornou-se também em posto de combustíveis e loja de conveniência, e cujo dono, há tempos, estende e exibe, na fachada do estabelecimento, faixas de oposição ferrenha e sanguinolenta ao governo e à política petista.
Muitas das faixas são autênticas charges - o Lula vestido de presidiário, o Lula com uma tira de papel higiênico sujo cruzada ao peito à guisa de faixa presidencial -, outras são palavras de ordem e de revolta - Fora, Dilma!, Lula na Cadeia, Já!
Nessa panificadora, o Lula não tem vez nem compra fiado. Pudera. Basta atentar para o nome, Elite. Mas o fato é que essa Elite - muito antiga no bairro - já deu e dá muito mais empregos do que o PT foi capaz de, ou quis, ou pretendeu.
Hoje, uma nova faixa. Com o costumeiro tom de bravata, porém, com um fundo de rendição, de toalha jogada ao centro do ringue. O cara se mostra ainda indignado e puto da vida, mas, frente aos recentes eventos e revelações da política nacional, estende suas críticas às demais legendas partidárias e anuncia sua capitulação.
Como não tenho celular nem máquina digital nem porra nenhuma dessas parafernálias idiotizantes, com as quais eu poderia ter fotografado a faixa, registrei-a com minha câmera visual-encefálica-sináptica e a reproduzi no Photo Filtre, respeitando, inclusive, o tipo da fonte, as cores e a disposição das frases.
Sem querer, creio que o dono da panificadora, talvez, tenha achado o novo e tão necessário caminho para a política brasileira. O início pela busca de uma renovada e unificada identidade nacional. Talvez a pamonha seja capaz de reconciliar o que a dicotomia Coxinhas x Mortadelas cisalhou.
Dicotomia que é uma versão bem humorada e eufemística da canalha, mal-intencionada e maniqueísta divisão da sociedade brasileira efetuada pelo calhorda do Sapo Barbudo, do Nove-dedos do PT : Elite branca x Povo. Lula, sempre movido a ganância, desonestidade e torpes motivos, reduziu o Brasil a duas classes sociais, a elite branca e o povo - até a Índia tem mais castas, mais opções. Sendo que, por elite branca, Lula considera e taxa qualquer pessoa - branco ou negro, homem ou mulher, viado ou macho - que não depende das esmolas petistas; qualquer pessoa que trabalha, que estuda para se capacitar, que paga suas contas e impostos, que consegue levar vida minimamente digna sem ter que pedir a benção do tio Lula e receber suas infinitas bolsas assistenciais. Para o Lula e o PT, elite branca é todo e qualquer cidadão que, por méritos próprios, não está preso ao cabresto comunista, que conseguiu romper o cercado do curral eleitoral do PT, com muito mais reses que o da Friboi e o da JBS, juntos. E povo, segundo o PT, é o coitadinho, é vítima da elite branca. O caralho. O "povo" de Lula e do PT é o vagabundo. É o cara que vive às custas do alheio
De onde fica fácil ver que a divertida briga Coxinhas x Mortadelas, lembrando até aquelas caricatas lutas livres antigas (Ted Boy Marino, Fantomas, Aquiles), não tem nada de engraçada. No fim, a rivalidade Coxinhas x Mortadelas, Elite branca x Povo, esconde a verdadeira briga de foice do país : Trabalhador x Vagabundo; o primeiro sendo posto na condição de vilão da história. Gravíssima, essa subversão de valores impetrada pelo PT. Quem sabe a pamonha não venha a começar a construção de uma sociedade em que cada qual receba e tenha direito apenas ao que faz jus, ao que faz por onde? Nem mais nem menos.
Além disso, a pamonha evitaria novas e futuras dissidências gastronômicas em nossa política e em nosso povo. Sim, dissidências gastronômicas, não políticas ou ideológicas. Somos um país primitivo, de primitivos, de motivações e necessidades primitivas. Tudo nos passa pelo estômago, não pelo cérebro. Não temos ideologias, a base de toda cultura civilizada e ordeira. Temos fome, a base de toda a corrupção.
No passado, tivemos a política do café com leite, agora, a da coxinha e a da mortadela. Qual será a próxima? Virado à paulista x Tutu à mineira? Pão de Queijo x Acarajé? Churrasco Fogo de Chão x Buchada de bode?
Com a pamonha, não haveria esse risco. É quitute bem aceito e apreciado em todo o território tupiniquim, pela elite branca e pelo povo.
Portanto, urge, já para 2018, o lançamento de um candidato nem coxinha nem mortadela, pamonha. O Dória, creio, poderia ser uma opção desse novo político.
Se bem que, mal a candidatura pamonha seja lançada, ela já correrá sério risco de ser imediatamente impugnada. Por crime eleitoral de propaganda política antecipada. Por se adiantar e infringir as datas e os prazos legais estipulados pelo TSE para a divulgação dos candidatos, suas propostas e plataformas.
Uma propaganda sutil, ainda que barulhenta; subliminar, ainda que explícita. Feita na maior cara de pau por carros de som nas vias públicas das pequenas, médias e grandes cidades do país : “Olha aí, olha aí freguesia. São as deliciosas pamonhas de Piracicaba . Pamonhas fresquinhas, pamonhas caseiras. É o puro creme do milho verde. Pamonha, pamonha, pamonha."
Essa merda me acorda todos os sábados, às sete da manhã. Aos domingos, as Testemunhas de Jeová.
Pãããããta que o pariu!!!

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4 Comentários

  1. Rapaiz.....ainda estamos conectados em pensamentos.....eu aqui em minhas férias comma família aqui em Natal, após uma semana de convívio resolvi postar um texto no face.....e não é q a fala final foi muito parecida....segue abaixo

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    1. Rapaz, não estamos conectados porra nenhuma, até porque sei bem o tamanho do seu cabo USB.

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  2. Estamos em Natal e vou confessar uma coisa, confessar não é bem a palavra certa, vou me penitenciar com o povo nordestino, povo esse q sempre tive como um povo vagabundo e escroque. Na verdade após algums dias aqui sou obrigado a admitir q esse pais não esta mais dividido entre pobresxricos, nortexsul, brancosxnegros e outras coisas mais, mais sim dividido entre quem trabalha x vagabundo. O pessoal daqui q pega no pesado......sejam garçons, bugueiros, taxistas, ubersistas, etc.......não podem nem ouvir falar dessa turma de Brasília, principalmente da turma da esquerda. O grande modelo para eles hj é nada mais nada menos q João.....nosso João Doria. Povo trabalhador de todo Norte e Nordeste, desculpem me pela ignorância.......e morte a todos os seguidores do sem dedo e sem vergonha na cara........

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    1. É isso aí, corno amigo. Vejo que aprendeste muito em nosso convívio. A grande guerra a ser vencida no Brasil é essa : trabalhador x vagabundo.
      E, sim, eu também votaria no Dória.
      Quando voltar de Natal, vamos marcar umas geladas!!!

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