Que Fossa, Hein, Meu Chapa, Que Fossa...(33)

Há toda uma geração de músicos da MPB que, embora tenha feito muito sucesso entre as camadas mais populares na década de 60 e 70 e vendido milhões e milhões de discos, sempre foi relegada a segundo plano pela crítica "especializada" da época, que controlava os jornais, rádios e TVs, uma crítica metida a inteligentinha e com (falsos) pendores comunistas. Mais que relegada a segundo plano, sempre foi malhada e vilipendiada pela intelectualidade de merda da época, para a qual só prestavam os artistas "engajados", aqueles que supostamente usavam seus dotes artísticos como instrumento de combate ao governo militar vigente. Os queridinhos dessa corja jornalística, entre outros, eram Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque, Gonzaguinha, Geraldo Vandré etc. Alguém acha mesmo que o Chico alguma vez lutou de verdade contra os militares?
Aos que não eram engajados do ponto de vista dessa canalha jornalística, aos que não nasceram dentro de uma elite tanto financeira quanto intelectual, aos que não protestavam contra a política da época, mas que cantavam sim as diferenças sociais - as realidades da empregada doméstica, da prostituta, do feirante, do caminhoneiro, do motorista de ônibus, do analfabeto -, foi impetrada a pecha de "cafona", como sinônimo de má qualidade e gosto duvidoso.
Pode ser que realmente os cafonas nada soubessem da conjuntura política da época, afinal, vindos também das classes mais pobres, eles tinham que trabalhar, não tinham tempo para ficar fumando maconha em diretórios acadêmicos e participar de passeatas. Mas conheciam muito mais das desigualdades sociais que qualquer "politizadinho" universitário, muito mais que qualquer comunistazinha de bosta que ficava a pensar em como consertar o mundo com seu copo de whisky na mão.
Pode ser que não tivessem - e realmente não tinham - o refinamento poético e musical dos da Tropicália ou dos da pernóstica, não negando sua grande importância e imensa qualidade, bossa nova. Mas que compensavam isso com muita emoção, com a emoção de quem vivencia o que canta, de quem veste de fato a pele do lobo, e não de quem olha o mundo de sua cobertura de frente para a lagoa Rodrigo de Freitas, isso compensavam. E sim, tinham também seus laivos de poesia. Eram poeta sim, ora porra. Bardos e menestréis das centrais de ônibus e trens, dos bares pés sujos e bordéis. E falavam a muito mais pessoas que os queridinhos da crítica : o cantor Nelson Ned já vendeu, sozinho, mais discos que toda a Tropicália e Bossa Nova, somadas. Aliás, até os dias de hoje, Nelson Ned é o segundo artista brasileiro mais conhecido, tocado e premiado no exterior. O primeiro posto é de Carmen Miranda, que nem brasileira nata era.
Entre os cafonas mais célebres : Odair José, Agnaldo Timóteo, Cauby Peixoto, Dom e Ravel, Paulo Sérgio, Antônio Marcos, Reginaldo Rossi, Altemar Dutra, Wando, Benito de Paula, Luiz Ayrão, Amado Batista, Evaldo Braga, Diana etc.
E claro, o homenageado dessa postagem, Waldick Soriano, o cafona-mor, o macho das antigas, o Eu Não Sou Cachorro Não da MPB. 
Waldick Soriano, falecido em 2008, era o rei da zona - querem título de nobreza melhor que esse? Com sua voz grossa, de homem, cantava velhos e doloridos bolerões. E dá-lhe fossa, meu chapa. A música a seguir conta a história do cara que assiste ao casamento da ingrata que o deixou em favor de outro mais endinheirado. No fim, Waldick lasca : para mim não foi noivado, para mim foi um enterro, que de branco aqui passou...
Pãããta que o pariu!!! E ainda vem jornalistazinho comunista de merda dizer que o cara não é um poeta?
Meu Coração Está de Luto
(Waldick Soriano)
Hoje está fazendo um ano
Que eu assisti seu casamento
Hoje está fazendo um ano
Que deixaste minha vida

Um rosário de tormento

O meu coração está de luto
Hoje está fazendo um ano
Que por ti vivo sofrendo
De que me deste o desengano


Tenho medo de morrer
Dói demais a dor do amor
Este amor não morrerá
A saudade ficará neste peito sofredor


Tu casaste por dinheiro
A vaidade te obrigou
Para mim não foi noivado
Para mim foi um enterro que de branco ali passou.

Postar um comentário

2 Comentários

  1. Para abrilhantar ainda mais este excelente texto escrito e postado pelo MARRETÃO, eu que sou fã incondicional do Frankk Sinatra brasileiro, um fato pitoresco que aconteceu em sua viagem/chegada ao Rio de Janeiro ele foi a procura de um radialista da Rádio Globo por nome de Haroldo de Andrade e mostrou-lhe cerca de uma dúzia de composições dele mesmo, todas elas, escritas em papel de cimento com lápis grafite... músicas estas que, posteriormente, transformaram-se em grande sucessos como por exemplo EU SEI QUE VOCÊ VAI CASAR COM OUTRO(Levarei muitas flores perfumadas) e a imortal PAIXÃO DE UM HOMEM...

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Pois é, guerrilheiro, tem muita coisa boa desse pessoal que foi perdida no tempo. E já que se interessa pelo assunto, há um livro escrito por Paulo César Araújo (o mesmo da polêmica biografia do Roberto Carlos) chamado Eu Não Sou Cachorro Não que conta e dá o merecido valor a toda essa geração dos chamados cafonas. O livro pode ser baixado facilmente no endereço abaixo:

      http://www.bregablog.com/2010/09/download-livro-eu-nao-sou-cachorro-nao.html

      abraço

      Excluir