O Tédio do Porco-Espinho

Exercer meu poder
Não me recompensa mais com nenhuma alegria,
Nenhuma satisfação,
Nenhum regozijo.

Exerço-o ainda,
Às vezes,
Com muita preguiça,
Com ânimos de burocrata de carreira.

Exerço-o
Bissextamente,
A contragosto,
Só para não pensarem que enfraqueci,
Só quando começam a confundir
A minha indiferença com debilidade
Ou com impotência.

Exultava-me, 
Antigamente,
Vê-los rasgar suas carnes em meus estrepes,
Em meus ângulos perfurocortantes,
Em minhas quinas enferrujadas.

Hoje,
Acaba-me com a paciência
Ter que me limpar do sangue deles em minhas arestas.
Acaba-me com a paciência
A burrice de não perceberem o meu farpado,
A burrice de pensarem
Que possam ser imunes ao meu tétano.

Hoje,
Entendo o tédio do porco-espinho,
O fastio do carrasco.

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