Cerveja-Feira (56)

Na certa, os leitores bebuns do Marreta já perceberam meu arrefecimento de ânimos em seguir com minha messiânica jornada em busca das cervejas boas e baratas, uma procrastinação de minha parte em prosseguir pelo místico caminho de Santiago rumo ao Santo Graal do bêbados desvalidos de bolso, dos quais será o reino dos Céus.
Em minha fraca e inconsistente defesa, devo dizer que esse desânimo não se restringe ao garimpar das boas e baratas. Ele tem se estendido a todas as outras atividades que um dia já me deram prazer. Pego um livro e não me concentro nele por mais de duas ou três páginas. Vou assistir a um filme e, logo, estou em estado de catatonia frente à TV. Penso em caminhar, mas só penso.
Tenho, há tempos, dado conta e me ocupado apenas da parte "chata" da vida, da rotina necessária à sobrevivência, de atividades que podem ser feitas em piloto automático. Limpar a casa, ir ao mercado, fazer a comida, cuidar das gatas, pôr o lixo pra fora e, desgraçadamente, continuar a me arrastar para o "trabalho", para o inferno em que eu me meti.
Uma vida em stand by.
Tanto que, nos últimos tempos, tenho pensado muito em me consultar com um psiquiatra, ver lá se ele me receita uns remédios que me deem alegria; um comprimidinho que me permita suportar o tempo que preciso passar acordado e um outro que me permita um melhor repouso no tempo destinado ao sono. Mas tais são os meus abatimento e prostração que também só penso em marcar uma consulta, só penso.
Porém, ninguém consegue se safar de seu destino, de seu fado, de sua sina. Ninguém consegue escapar ao fardo (de cerveja) que lhe foi predestinado.
O Universo sempre arruma o seu jeito de reestabelecer o equilíbrio cósmico e cármico. 
Se o Azarão não vai às boas e baratas, as boas e baratas vêm ao Azarão.
Na sexta-feira passada, esposa e filho, também em férias, foram passar uns dias num sítio de uma amiga dela em Cássia dos Coqueiros (SP), uma cidadezinha de uns três mil habitantes a uns 80 km daqui. Geralmente, quando vamos passar um ou dois dias por lá, chegar na sexta à tarde e voltar pelo domingo de manhã, eu os acompanho, também vou junto. Mas não desta vez, que foram na sexta para só voltar na outra terça-feira.
Temos duas gatas, duas irmãs já com quase 15 anos de idade, duas pequenas senhorinhas. Uma delas, a Cleonice, de uns três anos para cá, desenvolveu uma infecção intestinal crônica. Não é causada nem por vírus nem por bactéria nem por nada que possa ser morto ou eliminado. É algo do organismo dela, uma coisa meio autoimune, coisa de velho, enfim. 
Não há cura, há controle. Ela só pode comer um tipo de ração chamada hipoalergênica (cara pra caralho) e, todos os dias, tem que tomar 0,5 ml de um corticoide, a prednisona, administrado por mim com uma pequena seringa. Sob miados de protesto, eu a enrolo numa toalha, forço que ela abra a boca e, rapidamente, esguicho-lhe o remédio goela abaixo.
Se ela ficar até um dia, dois com muita sorte, sem a medicação, não ocorrem maiores danos. Porém, excedida essa margem de relativa segurança, ela começa a ter crises de vômito e diarreia e, facilmente, evolui para um preocupante quadro de desidratação.
Desta forma, não embarquei com eles para o sítio, fiquei para cuidar da menina Cleonice. Além disso, a sogra também foi. Ou seja, tudo conjurou para que eu ficasse em casa.
Então, na segunda-feira, véspera deles voltarem, recebi uma mensagem da minha esposa contando que eles tinham ido à cidade para se reabastecerem de víveres e de cerveja e que minha sogra, mão fechada feito eu, havia comprado, para experimentar, meia dúzia de uma marca de cerveja nunca dantes entornada. Aretzbeer. R$ 1,89 a lata de 350 ml, já gelada. Minha esposa disse não ter gostado, mas a sogra queria até voltar pra buscar mais.
Pedi-lhe, então, que me trouxesse duas ou três latinhas dessa maravilha, para tê-la em meus arquivos. O pedido saiu melhor que a encomenda. Trouxe-me uma dúzia. Um fardo. Ei-la já deitada em meu poderoso canecão. Pronta para o abate.
Aretzbeer. Receita alemã. Produzida no Paraná, pela Industrial Norte Paranaense de Bebidas. Claro que não é nenhuma puro malte, mas é melhor que muitas outras marcas comerciais famosinhas. Não fica devendo nada para a Skol, Antarctica, Sub Zero, Itaipava (inclusive a sua fraquíssima versão 100% malte), Kaiser etc.
O site Brejas deu-lhe nota 2,7 (de um máximo de cinco) na sua avaliação geral, que é uma média das notas conferidas ao aroma,  aparência, sabor, sensação e conjunto. O mesmo site, a exemplos, deu nota 1,5 para a Skol "normal" (2,4 para a Skol puro malte), 1,8 para a Antarctica Boa (2,2 para a Original), 2,6 para a Amstel e 2,2 para a Budweiser.
Só me incomodou um pouco um gostinho que aparece lá no final, um sabor residual meio adocicado. Mas nada que não possa ser compensado e equilibrado fazendo com que a Aretzbeer se faça acompanhar de um tira-gosto de jiló acebolado. Além do quê, todo mundo sabe que depois da segunda ou terceira lata, tudo quanto é gosto residual desaparece.
Aretzbeer. Mais uma a receber o selo ISO-Azarão das boas e baratas. Nesse caso, melhor ainda, das boas e de graça, uma vez que foi minha esposa quem desembolsou por elas.
Pããããããta que o pariu!!!!

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7 Comentários

  1. "Uma vida em stand by." Cara me identifico muito com isso. Eu até li um livro sobre micro-aventuras e tentei alguma coisa no sentido, para dar um encanto na rotina, mas sempre acabo me rendendo ao normal e fico no vai-e-vem que gira, gira e nunca chega a lugar algum. Vez ou outra me vêm na cabeça ter grandes pretensões e buscar algo novo e aventureiro, mas acho que me falta um pouco de coragem, vez ou outra.
    No fim, viver em standy by é o normal. Acho que a maioria das pessoas vive nesse sentido, mas quando me pego pensando, é meio depressivo, pensar que somos só um pó cósmico que, sem sentido ou motivo algum, pensa e anda, de nada rumo a coisa alguma.
    Também tenho dois gatos, entretanto são pequenos, acabaram de fazer 1 ano. Um deles têm asma, e também passei um tempo dando corticoide pra ele, mas em pílula. Eles não gostam de jeito nenhum, ainda bem que o meu gato ainda não precisa dessas rações especiais, que custam muito caro.
    Abs!!!

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  2. Micro-aventuras? O que é isso?
    E o quilo dessa ração tá saindo a 130 reais o pacote de 1,5 kg. Tudo bem que dê para cerca de uns 40 dias, mas caro pra caralho ainda assim.
    Abraço.

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    1. Micro aventuras é um conceito criado por um cara chamado Alastair Humphreys, um aventureiro inglês que fazia todo tipo de loucura, como escalar picos, entrar em savanas inabitadas, nadar em rios perigosos, coisas do tipo. Ele percebeu que, mesmo o pessoal gostando de ver aquilo, as pessoas comuns não têm coragem e/ou dinheiro para viver grandes aventuras, mas queriam sentir a emoção de viver algo novo. Ele escreveu um livro, chamado microadventures, onde ele fazia toda semana uma aventura casual no entorno de londres. Algo como sair do trabalho e voltar andando por um caminho desconhecido e passar em algum bairro novo. Só o fato de ser algo novo já libera aquela dopamina e deixa o cara com a sensação de ter feito algo diferente e de valor. (https://www.youtube.com/watch?v=vwHwXId0pxE)
      Quanto aos gatos, aqui minha irmã compra guabi natural (ração sólida) que está saindo 250 pila, mais ou menos, 7,5kg. Eles comem por 3 meses, mais ou menos. Meu maior gasto é com ração líquida. Compro uma vez por mês no atacado, e gasto cerca de 170 reais. Você também dá ração líquida as suas gatas?

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    2. Nunca tinha ouvido falar disso, ração líquida...

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  3. Caro azarão , a 1a parte do seu texto serviu como uma luva para mim. Além do desânimo infernal, ainda me deparo com problemas familiares , de trabalho e uma vizinhança muito filhadaputa que não deixa sequer ter sossego nem à noite. Até tenho como arrumar umas receitas com psiquiatra (para ligar e desligar...) mas nem sei se valeria a pena, dadas as impossibilidades de uma mudança de rumos na vida; Sinto como se a esperança e o ímpeto tivessem sido totalmente esgotados. Te parafraseando, que inferno me meti. Às vezes tento imaginar o porquê disso e só lembro do Pagliacci , da fábula de Alan Moore.

    Abração.

    Cássio - Recife/PE.

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    1. Nem me fale em vizinhança barulhenta, meu caro. Esse é mais um dos atributos do brasileiro, ser barulhento, se divertir acabando com o sossego dos outros; não basta o cara gostar de ouvir a merda de música que ele ouve, ele quer que todos a ouçam, é o pior tipo de fascismo que há. Mesmo onde moro hoje tivemos sérios transtornos com uma vizinha descasada e biscate que enchia a casa dela de manos pra dar a bunda pra eles e o pagodão corria solto madrugada afora. As coisas só se resolveram depois de muitas advertências e multas do condomínio e a ameaça de que a polícia seria envolvida no caso, se a situação permanecesse. Bastou falar de registrar um B.O. para que a biscate e os manos se assustassem. Ainda assim, vez ou outra, eles ainda incomodam um pouco. Mas muito mais raramente que antes.
      "Mas, doutor, eu sou o Pagliacci..."
      É foda.

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  4. É verdade. Até os bichinhos de estimação, hoje, são gourmets. Mas aqui em casa é só mesma essa gata, que é doente. Para a irmã dela, que não tem o mesmo problema, dou ração normal, de 15, 18 reais o quilo.

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