Cerveja-Feira (52)

De vez em quando, quando tenho o fundamental e imprescindível, porém, o cada vez mais raro tempo de ócio para me dedicar a atividades de que gosto - ler, ouvir música, assistir a longas-metragens -, mas que a fadiga, o stresse e as frustrações anteriores a ele me jogam num tal estado de prostração mental que me incapacita de usufrui-lo, costumo navegar pelo meu próprio blog, revisar e reviver textos, lamber a minha própria cria. Olhar para um texto escrito em 2009, 2010, 2015, é como olhar para uma velha fotografia em que estou mais jovem, vigoroso, melhor. É confrontar meu próprio retrato de Dorian Gray antes que o novo dia traga, de novo, a realidade inexorável do espelho plano. 
Ontem, vasculhando e espanando o pó das cinquenta e uma cervejas-feiras anteriores a esta, percebi que apenas em cinco delas há mulheres protagonistas : a apetitosa e fulgurante Scarlett Johansson, a bela, recatada (pero no mucho) e do lar Sandy, ex-Sandy & Junior e eterna Sandy-sim-é-possível-ter-prazer-anal, a chanceler Angela Merkel, a freira alemã Dóris Engelhard e a centenária estadunidense de 104 anos Mildred Bowers, que credita à cerveja grande parte de sua longevidade. 
É bem verdade que as mulheres aparecem em várias outras cervejas-feiras abrilhantando as postagens com seus belos corpos e tetas, mas como destaques apenas o quinteto citado.
Assim, para não correr o risco de ser chamado de machista, sexista e filho do Bolsonaro (embora, é verdade, eu adore uma rachadinha), o cerveja-feira de hoje traz e presta profunda reverência a duas bebedoras de cerveja das antigas. E bota das antigas nisso. Do tempo do teatro em preto e branco.
Hebe "gracinha" Camargo e Dercy "boca de esgoto" Gonçalves. Duas das grandes damas do teatro de revista, das chanchadas da Atlântida, do teatro, da música (quem não se lembra do clássico A Perereca da Vizinha?) e da teledramaturgia brasileira. Quiçá do cinema mudo.
A loiríssima Hebe Camargo sempre declarou publicamente o seu amor à santa bebida,  à qual ela chamava carinhosamente de loiruda. E tão assumida era a sua relação com a cerveja que ela não a escondia de ninguém. Antes pelo contrário, escancarava o seu gosto pessoal para o país inteiro. Em horário nobre e em rede nacional. 
Em seu programa semanal, gravado e transmitido ao vivo, quando lhe dava vontade, ou a sede assim exigia, Hebe convocava seu garçom e esse imediatamente ia ao seu encontro com uma ampola e um copo já servido de uma gelada em uma bandeja de prata. O garçom servia Hebe e ela dava uma senhora duma talagada na cerveja. Às vistas de todo o público presente no auditório e de milhões e mais milhões de telespectadores. Às vistas de toda a nação, o que não é exagero dizer, pois, na época, lá pelas décadas de 1980, 1990, só havia uma meia dúzia de canais de TV, e Globo e SBT, a emissora da Hebe, eram hegemônicas de fato.
Hoje em dia, Zeca Pagodinho, quando vai a um programa cantar, dar uma entrevista ou coisa que o valha, já é recebido com um copo de sua Brahma, e o público o ovaciona quando ele dá o seu golinho. Todos consideram a atitude do Zeca uma ousadia, uma transgressão, uma marca de sua autenticidade. Porra nenhuma!!!!
Hebe já fazia isso há 30, 40 anos!!! Hebe Camargo foi a precursora do pileque na TV!!!
E Hebe batia de cerveja de verdade. Mandava pro peito a Antarctica. A Antarctica original. Que não é essa Original de hoje em dia, já embichada e gourmetizada. Era a Antarctica que, talvez, hoje seja a chamada BOA, mas que, na época, a gente chamava de cerveja de pedreiro, mesmo. Cerveja das antigas.
Dercy Gonçalves era outra que também, segundo as más línguas que a rodeavam, não dispensava a sua cervejinha. Sempre que podia e não podia lá estava ela com o seu copinho na mão, nas coxias, nos bastidores e nos camarins dos teatros.
Tão notório e sincero era o amor das duas pela cerveja que a Antarctica as fez em estrelas de um de seus comerciais. Chamou-as para véias-propaganda de seu mais dileto produto.
Fico imaginando as duas pedindo ao garçom para trazer uma outra garrafa, para reabastecer-lhes o refil.
Hebe : - Garçom gracinha, traz mais uma loiruda pra gente!
Dercy : - Porra!!! Caralho!!! Buceta!!! Por que essa porra tá demorando tanto?!?!?

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2 Comentários

  1. Não sei se você chegou a pegar essa esquisitice (provavelmente não): as cervejarias engarrafavam suas cervejas indistintamente em garrafas de vidro marrom ou de vidro verde. Não sei era frescura de pinguço ou se a cor da garrafa realmente alterava o “buquê” da bebida. O que sei é que os apreciadores da breja só pediam “casco escuro”. Com isso, não passou muito tempo para que as bramosas da vida só fossem engarrafadas em garrafas de vidro marrom (Casco escuro). Hoje, a gourmetização das cervejas parece ter levado os fabricantes a utilizar ampolas de qualquer cor, mas imagino que os cervejeiros raiz talvez não aprovem essas modernidades

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    1. Rapaz, não se trata de esquisitice, não. A preferência pelo casco escuro (no bom sentido) faz todo o sentido. Mas como você mesmo diz, resposta grande vira post. Escreverei sobre e postarei. Será a próxima cerveja-feira.

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