Mimetismos (35)

Nesta mesma praça, talvez no ano passado, talvez no retrasado, já vira os estranhos e repugnantes frutos, as bizarras e repulsivas formações vegetais. Mas eram, então, apenas dois ou três, esparsos pela frondosa árvore e - eu não tinha como saber na época  - estavam ainda beeeeeeem no início de seu desenvolvimento. Por isso, não foram dignos de nota na ocasião. Hoje, isso mudou.
Passo pouco por esta praça, só quando, como hoje, pego um caminho alternativo ao usual, não por necessidade, apenas para sair um pouco da rotina.
A árvore continua lá, em uma de suas esquinas, no cruzamento da rua Daniel Kujawski com a Margarida, exatamente como eu me lembrava dela, mas os seus frutos... quanta diferença! Não lhes fazem mais justiça os adjetivos "estranhos" e "bizarros", nem mesmos os "repugnantes" e "repulsivos". "Medonhos" e "assustadores", "horripilantes" e "aterradores", com muito mais fidedignidade, agora lhes qualificam.
Não mais apenas dois ou três; agora, eles pendiam e pendulavam às dúzias dos galhos da árvore. Não mais formações imberbes e nanicas; sim grossíssimos tarugos que atingiam, fácil, fácil, uns 40 ou 50 cm.
Do outro lado da rua, num antigo ponto de táxi, dois motoristas jogavam conversa fora à espera de suas próximas corridas. Fui até um deles e perguntei se ele sabia que árvore era aquela. Ele riu e falou, estranha, né? Bota estranha nisso, eu disse. Não sei como se chama, não, mas já peguei uns três desses negócios ai, falou. Pegou pra ver se era de comer?, eu, na minha santa ingenuidade. Não, pra sacanear com os amigos, pra colocar no banco do carro deles à noite e ver eles sentando, e riu com gosto. Ri também. É claro. E nem poderia ter deixado de. Molecagem de macho das antigas. De tiozão de churrasco.
Motorista de Uber, eu não sei, já deve ter muito viadinho e metrossexual ao volante, mas motorista de táxi raiz é tudo macho das antigas, aquele cara de meia idade, barrigudo, camisa aberta até o terceiro botão a mostrar os pelos do peitos e imensas rodelas de suor sob os suvacos. Chenile alaranjado nos bancos do carro, toca-fitas Motorádio e imã com a imagem de São Cristóvão grudado no painel.
Falei pra ele, olha, eu não uso celular nem tenho câmera etc, será que dá pra você tirar umas fotos e mandar pra mim num e-mail? Não sei disso de e-mail, não, só sei mandar no zap, ele falou. Passei o número do telefone da minha esposa e torci para que ela não apagasse a estranha mensagem antes que eu chegasse em casa.
Ele me deu o celular e falou, vai lá e tira, que depois eu envio, e me acrescenta no contato, Cebolinha taxista, pra se precisar de táxi algum dia. Bati uma meia dúzia de fotos. Devolvi o celular pra ele e ele falou que já tava me mandando. Agradeci e acelerei o passo pra casa.
Por sorte, minha esposa estava ocupada com outras coisas e nem vira ainda a mensagem. Expliquei pra ela e ela as encaminhou ao meu e-mail. Juntou o celular do taxista, que não me pareceu dos mais novos, e mais a mão sem nenhuma habilidade em manejá-lo desse que vos fala e as fotos saíram uma boa merda, meio desfocadas, sem muita defínição. Escolhi as duas "melhores" e as combinei abaixo.
Não obstante a baixa qualidade das fotos, o buscador de imagens do Google conseguiu reconhecer os frutos e me forneceu mais fotos - muito melhores que a minha -, o nome e outras informações sobre a agigantada espécie.  Abaixo, uma imagem que mostra exatamente como foi o horror por mim presenciado.
A espécie é registrada no Cartório Lineano como Kigela Pinatta, mas é chamada popularmente, é óbvio,  de árvore-de-salsicha. Seus frutos são venenosos para o ser humano e podem atingir 60 cm de comprimento e 7 kg de peso.
Descobri também que ela não é nativa do Brasil, sendo pouquíssimo difundida por aqui, apesar de se adaptar bem ao clima. Seu cultivo é mais restrito a parques, jardins botânicos e coleções particulares de apreciadores de espécies exóticas, ou seja, de "entendidos" no assunto. 
A Kigelia Pinatta é de origem - é óbvio, de novo - africana!!!
E tem gente que ainda não acredita na Evolução, que não acredita que todos os seres vivos derivaram de uma mesma protomatriz biológica. E tem gente que ainda acredita que as diversas semelhanças de forma observadas entre plantas e animais, das quais os últimos muitas vezes se valem para se proteger de predadores, ou para melhor se aproximarem de suas presas, sejam meras coincidências. Quem um dia poderá dizer que a Kigelia Pinatta não é o ancestral botânico do Kid Bengala? Que mão, que olho imortal, se atreveu a plasmar a terrível semelhança?
Também tomei conhecimento de outras variedades da árvore-de-salsicha, de adaptações da Kigelia em outros continentes. Nenhuma, é claro, tão colossal quanto a africana. Há até uma subespécie japonesa. Uma árvore-da-salsicha bonsai, se quisermos assim considerar. Abaixo, os frutos da variedade nipônica.
Pãããããããããta que o pariu!!!!!!!

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