Um Castanho E Polvorento Pôr-De-Sol

Encontraram-se num crepúsculo marrom
Onde o cheiro da poluição
Pareceu, a ambos, instantes antes de se encontrarem,
Com cheiro de café em torrefação.
Talvez tal cheiro, percebido apenas pela memória dos dois,
Fosse prenúncio do encontro
(coincidência? Um alarme para que desviassem de seu caminho e evitassem o esbarrão?).

Não eram mais jovens
- ele já não podia ter sido assim classificado quando se conheceram -,
Reconheceram que o cheiro de café
Não era de origem atmosférica,
Reconheceram o cheiro do café um no outro.
A cor do café em vossos olhos:
Preto, amargo e ainda combativo nos olhos dela,
Um tom mais arrefecido, leitoso, quem sabe nublado por incipiente catarata, nos dele.

Abraçaram-se forte e tenazmente
Como sempre faziam quando conseguiam se encontrar,
O mesmo vigor no abraço ainda que mais de década houvesse transcorrido.
Abraço que foi tudo o que sempre se permitiram,
Abraço que sempre foi a linha divisória para tudo o que poderiam ter tido,
Abraço - que por isso mesmo - não podia ser mais que isso,
Ainda que naquele reencontro, e nem depois dele,
Abraço que não tinha mais tempo para evoluir.

Convidaram-se telepaticamente a ir tomar um café,
Sentaram-se a aspirar seus próprios cheiros saídos das fumegantes xícaras,
Sentaram-se a olhar um pro outro como antes faziam.
O olhar dele sempre se desviava antes do dela,
Uma derrota que ele nunca se importou em sofrer.
Ele sacou, sem aviso, uma barra de chocolate branco de sua aljava
(outra coincidência?)

E só, então, começaram a conversar.
E a reviver,
Uma vez mais e mais outra...
Puseram-se a reviver
Tudo aquilo que nunca haviam vivido.

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