Sensações Perdidas

O alívio pela chegada 
Do gibi do mês
Às bancas
(enfim, retomar o gancho da história como quem prossegue em conversa interrompida com um amigo).

A descoberta daquele LP fora de catálogo
Na prateleira de um sebo
(a viril agulha de diamante a fazê-lo gemer sem sentir dor).

O esperar pela carta,
O rasgar do envelope
E o prazer tátil do desdobrar
Do papel de seda pautado
(suas trilhas tomadas por uma procissão de garranchos azuis-bic).

A primeira medalha de ouro 
Conquistada no judô
(sim, cheguei à faixa laranja),
O primeiro grau 10 em Química no colégio
(depois de um vexaminoso 3).

O primeiro beijo em nova boca
(o primeiro beijo em língua nunca dantes navegada é sempre o primeiro da vida),
A primeira brochada
(os deuses a me lembrar de minha mortalidade de finitude).

Ex-sensações
Expatriadas
Extraditadas
De mim
(por mim?).

Em algumas madrugadas,
Contudo 
(minha imunidade mais desatenta),
Elas me voltam e me atingem 
Com tudo :
Como um prurido de sarna,
Como uma coceira de urtiga
Em membro fantasma
De um mutilado de guerra.

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18 Comentários

  1. Muito legal, mas eu sempre tento não sentir saudade de um tempo que já faz parte das páginas de um diário antigo talvez nunca escrito, pois o amargo da boca pode aumentar. Me permito (permito-me?) apenas sentir saudade de mim mesmo (e de algumas poucas pessoas, lógico), a saudade do que poderia ter feito e nunca fiz ou do que fiz e jamais deveria ter feito. Abraços.

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    1. Eu também tento evitar, Jotabê. Mas, como eu disse, tem dias em que a imunidade está mais distraída, aí já viu, né? Ainda nessa fase em que ando de total desolação, de total desânimo e com o médico querendo aumentar a dosagem da medicação que já tomo. Desânimo total, sobretudo no âmbito profissional. Tanto que durante as férias todas, uma ideia ficou martelando muito forte na minha cabeça, e continua a martelar cada vez mais forte : pedir minha exoneração do serviço público. Depois de quase 25 anos. Se eu tivesse fundo de garantia, acredite, teria pedido a exoneração nessas férias. Mas não temos FGTS, não importa o quanto tenhamos trabalhado saímos com uma mão na frente e outra atrás. E com filho ainda pra criar fica complicado. E depois de quase 30 anos como professor, trabalhar em quê? E onde? Quem absorveria a mão de obra de um cara caminhando para os 60 anos? Tenho quebrado a cabeça aqui numa maneira de pular fora, mas com um mínimo de segurança, nem que for pra ganhar menos (menos ainda) do que já ganho, mas não consegui ainda vislumbrar nada palpável. Simplesmente, não suporto mais o ambiente escolar - alunos e professores -, virou uma coisa nociva, insalubre,um campo de batalha. Está acabando comigo. E olha que não sou cara dos mais sensíveis e melindrosos.
      Diante disso, é inevitável, vez ou outra, me render (render-me) ao saudosismo, que nada mais é que um tipo de droga, de entorpecente também. Inútil, paliativo, mas enfim...
      Abraço.

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    2. Quanto tempo resta para a aposentadoria? Mais prudente aguentar mais um pouco e se aposentar. Daí você pode começar uma nova fase da vida sem a pressão financeira.

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    3. Olha, Marreta, eu sugiro que nunca peça exoneração. Meu irmão mais velho trabalhava concursado em um órgão da PBH. Tendo um temperamento mais "marreta", pouco tempo antes de se aposentar, pediu demissão, por não suportar mais os petistas que tinham "invadido" o órgão. Arranjou outro emprego? Não. Como não converso mais com ele, não sei como fez para se arrastar até o momento da aposentadoria. Por isso fica a dica: segure essa onda! Abraços

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    4. Leciono desde 1994, porém, ingressei no serviço público como efetivo concursado apenas em 2000. Portanto, faltam ainda 7 anos para os 30 em sala de aula. Sete anos para dar o tempo e mais um ano, um ano e pouco do tempo que leva para todo o processo de aposentadoria tramitar no estado. Oito anos, no mínimo. E na progressão exponencial negativa que as coisas andam, não sei se chego mesmo lá. Não, pelo menos, de posse de minha saúde mental, já bem debilitada, mas também não posso simplesmente chutar o pau da barraca, sei disso.
      Abraço.

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    5. Então, Jotabê, em relação a isso, tenho plena consciência, não exonerarei sem estar empregado em outra função. Sou como o Tarzan, não largo dum cipó sem estar agarrado a outro. O problema é que apesar de ser um cara de razoáveis conhecimentos (comparado, é claro, à triste média atual), sou um homem de poucos conhecidos, de poucos ou mesmo de nenhum contato que possa me recolocar no mercado de trabalho. E nem precisa ser como professor de uma instituição privada, não. Aliás, é até melhor que nem seja como professor. Mas estou pondo a cabeça para quebrar.
      Além desse tempo todo de Estado, de estatutário, tenho mais uns 12, 13 anos de carteira de trabalho, de CLT. Vou procurar um advogado trabalhista para que ele faça uma análise se compensa eu transferir esse tempo de iniciativa privada para o serviço público, ver se dá pra abater alguns anos, acelerar minha aposentadoria, mesmo que seja proporcional, mesmo que seja para não me aposentar integralmente.
      Acredite : eu estou mesmo doente e tal do tratamento que faço desde agosto passado já não faz nem cosquinha no problema; segundo o médico, eu posso ou aumentar a dosagem do "remédio" ou trocá-lo por algo mais forte. Nenhuma das duas opções me agradam. Viver feito um zumbi, dopadaço? De fato, é uma ideia que nunca me agradou.
      Mas enquanto isso, vou levando, uns dias piores, outros menos ruins.
      Abraço

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    6. Se a situação ficar muito ruim, procura um psiquiatra e pede um atestado pra se afastar por um tempo.

      Hoje vejo muitos professores conseguindo renda extra na internet. Criando canais no you tube, páginas no Instagram e dando "banca" on line.

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  2. Belo texto. Creio que muitos de nós nos sentimos assim. Sempre com uma sensação de nostalgia. Isso significa que nosso passado foi belo. Me identifiquei demais com as primeiras estrofes....Ah, o cheiro dos gibis novinhos nas bancas....Mas aqueles gibis maravilhosos dos anos 80 e 90....

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    1. Pelo jeito você é leitor de gibis das antigas, da época dos formatinhos, né? Continua acompanhando as atuais HQs? Vi que você tem um blog onde coloca recordações das décadas de 70, 80 e 90. Acabei de adicioná-lo à lista de blogs aqui do Marreta.
      Abraço.

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    2. Sim. Tive muitos gibis nos anos 80 e 90. Hoje só releio os que consegui readquirir. Pois as traças acabou com meus originais. Fui descuidado. Sou um saudosista. Gosto de lembrar da minha época de criança, adolescente. Seu blog é muito bom e fico lisonjeado em ter adicionado o meu a sua lista. Farei o mesmo. Estou vendo algumas postagens antigas daqui, pois conheci seu blog a pouco tempo. Abraços!!

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    3. Tenho muitos gibis guardados ainda, mas todos já da minha fase de super-heróis. Tive muitos também dos chamados infantis, Turma da Mônica, Disney etc, mas esses foram sendo repassados para irmãos e primos mais novos e se perderam no tempo.
      Fique à vontade em vasculhar o blog. Eu também ainda não tive tempo de dar uma boa olhada no seu, mas garanto que farei.
      Abração.

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  3. Rapaz, a descrição da impressão que o poema lhe causou ficou melhor que o próprio poema!!!
    Eu realmente, quando fico de madrugada a escutar bem baixo as músicas de que gosto, a bebericar minha cerveja na companhias das gatas, ocupo um canto da sacada, fico a uma mesinha onde ponho lá o toca-CDs ou uma pequena caixinha de som com bluetooth, com as luzes apagadas.
    Valeu.

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  4. De novo, agradeço demais pelas palavras, Fabiano. Sei de tudo isso que você falou, tenho conversado com pessoas a respeito e elas são unânimes em que eu devo aguentar até o fim. Nós, que passamos muito tempo no serviço público, somos meio parecidos com aqueles pássaros que sempre viveram em gaiola, não conseguimos sobreviver no mundo "real". Além do quê, tenho 55 anos, considerado velhíssimo pelo mercado de trabalho, embora não tenha nenhuma limitação física ou intelectual que me impeçam de bem exercer minha profissão.
    Vou dar uma olhada em outros concursos, para outras áreas, conversar com uns poucos conhecidos que atuam na área de biologia, mas fora da sala de aula. Não tomarei nenhuma atitude impensada, porém, na eventualidade de surgir algo que eu considere viável, creio que não terei dúvidas em pedir minha exoneração. Mas... vamos seguindo, né?
    E concordo com você, uma boa mamada é um bom paliativo.
    Abraço.

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    1. Licença-prêmio, tirei os últimos 30 dias que tinha no ano passado. Mudar de ambiente sempre ajuda, ou quase sempre. Removi-me para a escola em que estou em 2021, depois de 18 anos em outra, achei que fosse melhorar, mas não deu muito certo não.
      Esse ano, não tem mais jeito, mas para o próximo ano, pretendo reduzir a minha carga horária, para ter algum tempo de pensar em outra atividade à qual possa me dedicar, pois com o dia praticamente todo tomado não dá nem pra pensar direito.
      Mas vamos levando, fazer o quê?
      Obrigado pelas palavras e um grande abraço.

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  6. Achei que você gostaria de saber que em BH existe um bloco de carnaval com este nome: "Me Bebe Que Sou Cervejeiro".

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    1. Pois é, nesse bloco, eu sairia fácil. Vestiria o abadá! Me acabaria na folia. BH tem uma tradição de blocos carnavalescos muito forte, né? Essa semana mesmo, vi num noticiário que o pessoal tá meio revoltado porque não acontecerá o concurso de marchinhas. Esse lado do carnaval, meio anárquico, que é o objetivo da coisa, eu gosto bastante. Já os desfiles das escolas, aquela coisa disciplinada, militarizada, até (já reparou como eles parecem paradas militares do sete de setembro, não pode atrasar, não pode atravessar etc), eu não curto muito, não.

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