Quando Eu Voltava das Festas

Somos socialmente moldados a perpetuar a célula da família - procriar é biológico, alicerçar e erigir uma família é puramente social.
Somos condicionados - por pais, parentes, professores, novelas das oito - a pensar que a solidão é uma doença, é o câncer da alma. Somos doutrinados - por poetas, romancistas, letristas de MPB e roteiristas de Hollywood - a crer que uma vida tranquila, sem responsabilidades para com outrem, sem nem um passarinho pra dar água, é uma vida vazia.
Fazem-nos confundir sossego com ausência de sentido.
Só desfazemos a confusão, só nos damos conta do engodo, quando perdemos a solidão, quando ela, amante traída, no abandona e não vem nos visitar nem mais nos domingos e feriados.
A vida do solitário não é vazia. Tampouco cheia de dor e de desespero. A vida do solitário é bonita pra caralho - como nos diz o maluco beleza Rogério Skylab na canção "Quando eu voltava das festas".
A canção, com letra que não recomendo aos paladares mais sensíveis, está no disco "A Trilogia dos Carnavais", recomendado a mim pelo Gianndre, um ex-aluno, hoje graduando, talvez já graduado psicólogo, em cujo divã, pelo andar da carruagem, não tardarei em me deitar - mas sem nenhum tipo de viadagem. Gianndre também é o menestrel do blog P-o-e-s-i-a.

Quando Eu Voltava das Festas
(Rogério Skylab)
Quando eu voltava das festas
Chegava em casa arrasado
Sofria de sinusite
E não sabia

E quando eu acordava
Eu vomitava
Depois ia pro McDonalds
E comia um McFish

Então voltava pra casa
Um pouco mais conformado
Se eu ficasse tarado
Putaria

Comia gente do hospício
Bichas e criancinhas
A vida de um solitário
É bonita pra caralho

Andava nu pela casa
Fazia o que eu queria
Rock, bumba, xaxado
Poesia

E quando vinha o dilúvio
A nuvem negra baixava
Não tinha saída
Eu dancava o puladinho

Confesso que não sofria
Naquelas noites de insônia
Fumava um baseado
E dormia

Havia um abandono
Havia um quê de alegria
A vida de um solitário
É bonita pra caralho

Aialaialaia
Laialaiala
Aialaialaia
É bonita pra caralho

Para ouvir a música, é só clicar aqui, no meu poderoso MARRETÃO.
em tempo : esta postagem vai pro meu irmão mais novo (já não tão novo assim), recém-casado, casadinho de novo, e que, segundo as más, porém confiáveis, línguas, já anda a sentir falta de seu "cantinho".

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4 Comentários

  1. Desse álbum, essa é a melhor, sem dúvida. Ainda que a "eu e minha ex", magnífica interpretação da música do Júpiter Maçã, faça arrepiar.

    Agradeço as palavras, no mais.

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    1. Gostei bastante também da Aqui Todo Mundo é Preto (Roberto Carlos, Jesus etc). Mas a rainha é mesmo a Empadinha de Camarão; sensibilizou-me demais; embora de tal sabor nunca tenha me caído à boca, posso imaginá-la correlata à de bacalhau, esta mais tradicional.

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  2. Estou perdendo a capacidade de dizer ou escrever alguma coisa que não seja banal, previsível ou descartável, mas gostei muito do seu texto, bom de ler, e também da letra do Sky lab (não conhecia)

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    1. Que bom que você ainda esteja perdendo, eu já perdi há tempos. Sim, também achei um texto bom de ler, mais leve que os meus costumeiros.
      Se quiser conhecer um pouco mais da obra do Skylab (nome inspirado naquela estação espacial que caiu, isso lá na década de 70, lembra?), sugiro começar por alguns de seus clássicos : Matador de Passarinhos, Convento das Carmelitas, Carrocinha de cachorro quente e a supracitada Empadinha de Camarão.
      O sujeito é uma figura ímpar e impagável. Vale a pena ouvir mais um pouco dele.

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