Pequeno Conto Noturno (10)

- Ainda dou uma boa chupada? - Sabrina pergunta a Rubens, tirando a cabeça do meio das pernas dele, subindo e recostando em seu peito.
- Dá - diz Rubens.
- Sei lá, tô achando meus lábios meio ressequidos, ficando meio murchos, tô pensando em injetar gordura neles, acho que é lipoescultura que chama, para eles voltarem a ficar viçosos, apetitosos.
- São bem apetecíveis para mim.
- É que homem não repara nessas coisas, eles tão meio murchinhos, sim. Quer ver só?
- Diz.
- Eu tenho celulite?
- Não.
- Estrias?
- Não.
- Meus peitos já estão com uma curvatura mais "cansada"?
- Até onde vejo, não.
- A pele embaixo dos meus braços tá flácida, balançando quando agito a mão?
- Não.
- Tá vendo, só... ou vocês são uns mentirosos, ou não reparam, ou não se importam. Eu tenho tudo isso, sim, e agora também os lábios.
- Olha, você não precisa fazer porra de lipo-coisa-nenhuma, está tudo coerente em você.
- Coerente? Que merda é essa? Vai continuar dizendo que eu tô com tudo em cima? Olha isso...
E Sabrina aponta as estrias, os focos de celulite, aperta os culotes, bate na pele embaixo dos braços.
Rubens gargalha.
- Tá rindo, né, filho da puta? Quero ver o dia em que teu pau cair.
- Aí, eu procuro um médico.
- Tá vendo...
- Mas aí eu estaria me ocupando da função, da falta dela no caso, e não da forma. E você está funcionando direitinho no que me concerne.
- Vai continuar dizendo que não tenho que consertar nada disso.
- Não, não tem. Vai pegar uma cerveja pra gente que na volta te explico.
Ela vai e volta, enrolada num lençol, dá um bom gole, limpa a espuma do lábio superior e passa a garrafa para Rubens.
- Pronto, me explica agora essa merda de "coerente".
- Você não tem que consertar nada porque não tem nada a ser. Você não tem celulite, estria, culote... nada disso. O que você tem são, pura e simplesmente, 42 anos.
- 41!
- Que seja, e é isso o que eu digo ser coerente.
- Não sei se entendi onde você quer chegar - e Sabrina dá outro gole, entorna quase toda a garrafa.
- Veja meu caso - continua Rubens -, eu não tenho cabelos brancos, rugas, pescoço estriado, nem uma protuberância no ventre que resiste a todos os meus esforços para que não se torne uma barriga, não tenho nada disso, o que tenho são 48 anos.
- Sei...
- O que tô dizendo é que olho pra você e não vejo nada flácido ou murcho, e sim uma mulher de 42 anos...
- 41!!!!
- ... de 41 anos plenamente funcional e desejável.
- Sério?
- Sim.
- Huuummm... você faz isso parecer tão simples.
- Eu sou um cara simples, de fácil trato.
- Você, simples? Tá bom. Fica parecendo uma coisa boa, natural...até romântica.
- E é bom, é natural. E eu sou um incurável romântico.
- Você, romântico? Tá bom.
- Pega outra cerveja? - pede Rubens, matando a garrafa.
- Pego.
E Sabrina vai, sem lençóis enrolados dessa vez.
Se ainda não em plena concórdia com seu corpo, ao menos segura de que os olhos que a acompanham pelas costas estão satisfeitos e desejam o que veem, e isso lhe dá um passo mais altivo.
- Toma - diz ela - é a última.
- Tudo bem, já passam das duas horas, logo tenho que me levantar.
- Rubens... - ela voltando a se recostar.
- Diz.
- Você foi sincero mesmo quando respondeu minha pergunta?
- Claro.Você ainda tem uma bela duma, digamos, "embocadura".
- Safado...
- Mas se ainda estiver duvidando, se quiser uma corroboração, uma análise mais apurada, meticulosa...
- Tá querendo outra chupada, é?

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