Cerveja-Feira (45)

O idoso, aquele a quem, antigamente, a gente chamava de velho, não perde apenas o tônus, a força muscular, os dentes e os cabelos. Não lhe debilitam apenas os reflexos, a memória, o pau, os cinco sentidos. Eu havia lido, há algum tempo, que a idade também tolda o discernimento e o julgamento que o idoso faz das pessoas e do mundo. Fica-lhe cada vez mais difícil diferenciar a verdade da mentira, enxergar o limite do plausível, reconhecer bons e maus caracteres, separar a boa vontade alheia do oportunismo de rapina.
Ao contrário do que diz a ignara sabedoria popular, velhos não ficam mais ranzinzas e azedos. Pelo contrário, tornam-se mais dóceis, mais facilmente influenciáveis. Tornam-se completos crédulos. Que é o mais vulnerável dos seres.
Não é à toa que os idosos são o alvo preferencial de golpes e de contos do vigário. Nem é tanto a falta de capacidade de reagir fisicamente, de sair na porrada se for o caso, que faz o idoso em presa fácil dos golpistas, mas, sim, a falta de capacidade de perceber o golpe, de distinguir o malandro do bom sujeito.
Não é à toa que a maioria dos consumidores de canais de televendas é composta por pessoas idosas. Não é à toa que o público massivo dos antigos bingos das décadas de 1990 e 2000 fosse também formado por aposentados. Não é à toa que velhinhos, não raro, se apaixonam por bucetinhas novas e as declaram suas herdeiras universais, deixam tudo para a buceta : casa, aposentadoria, seguro de vida. Estudos também mostram que os velhinhos estão entre os maiores replicadores de fake news; não por dolo, por acreditarem nelas de fato.
Devo estar a entrar nessa fase, da credulidade incondicional.
Na semana passada, caí em dois contos do vigário cervejeiro. No conto das puros maltes. A Spaten e a Itaipava 100% Malte. A primeira até com grandes outdoors pelas ruas da cidade. A segunda anunciada à exaustão em comerciais da TV. 
A Spaten, eu já estava a namorar há algum tempo, sempre que entrava na loja de conveniência para comprar a minha fiel Lokal. Então, aproveitando uma leve redução de seu preço, a comprei. R$ 3,46 a latinha de 350 ml. No rótulo, diz que é fabricada desde 1397, com a mais pura receita alemã. Comprei só uma latinha. Talvez eu ainda esteja no estágio de crédulo, porém, precavido. Foi a minha sorte. Uma bosta, a tal Spaten. Impossível, numa prova às cegas, diferenciá-la, por exemplo, de uma Sub Zero. Nem contei à minha esposa, tamanha vergonha que senti por cair em tal logro. E isso, já na quarta-feira.
No sábado, escarrapachei-me em uma segunda arapuca, a Itaipava 100% Malte. Já tinha tomado a Itaipava Premium Puro Malte, e gostado dela. Até cheguei a pensar : que diferença há entre puro malte e 100% malte? Nenhuma, muito provavelmente, eu mesmo concluí. Mesmo assim, comprei. Mesmo assim cai nessa maracutaia semântica. Como era sábado, comprei duas, uma para mim e outra para minha esposa, fora as nossas marcas rotineiras. R$ 2,99 a lata de 350 ml. Outra bosta! Pior que uma Glacial.
Em meu favor, no caso da Itaipava 100% Malte, talvez possa pesar o motivo que eu, inconscientemente, quisesse, feito um jogador de pôquer em maré de azar, recuperar a aposta malograda de quarta-feira, a Spaten, e me redimir aos meus próprios olhos. Mas caí em outro blefe.
Por isso, digo a esses moços, pobres moços, que acreditem em mim : passem longe da Spaten e da Itaipava 100% Malte, fujam delas.
E como não posso mais confiar em meus envelhecidos e enferrujados instintos, de hoje em diante, puro malte, só se me derem de graça.

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2 Comentários

  1. Concordo quanto à Itaipava puro malte. A Spaten me pareceu melhorzinha, até mesmo uma alternativa mais em conta à "salgada" Heineken.

    Agora, não caia na armadilha da nova aposta de quinta linha da Heineken, a tal Tiger. Lembra da Proibida Mulher? Pois é melhor beber água.

    Em minha cidade, foi um fracasso. Comprei a R$3,00 uma lata para degustar. Dias depois, vi a promoção de três latas por R$2,00 cada. Promoção eterna, por assim dizer, para ver se alguém desencana essa coisa do mercado de uma vez.

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    1. Rapaz, que coincidência você falar dessa tal Tiger. Vi-a hoje no Tonin Atacado, mas nem o preço nem a estampa me agradaram, passei batido por ela. Acabei comprando a Brahma Extra Lager (aquela da latinha dourada), que é uma das que eu mais gosto, R$ 2,39.
      Da Proibida Mulher, nunca provei, mas a pilsen Puro Malte da Proibida também é uma bela merda. A Proibida Puro Malte Golden Lager, da latinha preta, é boa.

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