Este é um blog defunto.
Logo, não vi nenhum problema, inconveniente, ou contradição, em dar uma escapadinha do Inferno, valendo-me de uma raríssima cochilada simultânea das três cabeças do Cérbero, para vir aqui dizer de outro defunto.
Não um defunto qualquer. Não de um saco de ração para vermes vulgar. Sim de um que vale o risco de levar uma mordida de lava e enxofre do cão dos tártaros e também o de ser punido pelo capeta com o castigo máximo que ele pode a mim destinar, fazer com que eu seja obrigado a pegar jornada letiva integral na escola pública do Inferno.
Do Raul! Do grande Raul Seixas! O Maluco Beleza. A Mosca na Sopa. O Cowboy Fora-da-Lei. O Carpinteiro do Universo.
Ouvi hoje pela manhã na rádio CBN e não pude resistir. Hoje, 21 de agosto de 2019, a morte de Raul Seixas completa 30 anos. Pancreatite aguda.
Em 1989, ano de sua morte, eu contava com meus tenros e viçosos vinte e dois aninhos, inocente, puro e besta. À época, eu começava a me arriscar em meus primeiros poemas, poesias e textos. Mantinha um diário em cujas páginas eu derramava minhas lamúrias, diariamente. Diário de verdade, nada de virtual, de papel mesmo, um caderninho. Coisa de viado.
Neste diário, em 21 de agosto de 1989, há exatos 30 anos, diretamente do túnel do tempo, eu (o eu que eu era, o eu que eu fui), num estilo que refletia minha total inexperiência com as palavras, num estilo toscamente pueril, sobre a morte do rei do rock brasileiro, escrevi :
"Ele nasceu há 10 mil anos atrás, ouviu o sinal das trombetas dos anjos e dos guardiões. Foi a mosca na sopa de muita gente, aprendeu o segredo da vida vendo as pedras que choram sozinhas no mesmo lugar. Ele foi o filho que ainda não veio. O começo, o fim, o meio.
Controlando a sua maluquez tornou-se em uma genuína metamorfose ambulante. Nunca se sentou no trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar. Nunca foi besta pra tirar onda de herói. Disse estar calejado e que se cansou de andar na contramão. Agradou a Deus fazendo o que o Diabo gosta. Manteve em segredo, mas manteve viva a sua paranoia. Coroou-se Carpinteiro do Universo. Morreu, e nem sabe mesmo qual foi aquele mês. E que, enfim, um de seus mais dolentes desejos - ele, que sabia que tem tanta estrela por aí - se realize, que o moço do disco-voador o venha levar desta para uma melhor."
Para encerrar e voltar à minha tumba, deixo uma das canções de Raul Seixas de que mais gosto, S.O.S
S.O.S
(Raul Seixas)
Hoje é domingo
Missa e praia
Céu de anil
Tem sangue no jornal
Bandeiras na Avenida Zil
Lá por detrás da triste
Linda zona sul
Vai tudo muito bem
Formigas que trafegam
Sem porque
E da janela
Desses quartos de pensão
Eu como vetor
Tranquilo eu tento
Uma transmutação
Oh! Oh! Seu moço!
Do Disco Voador
Me leve com você
Pra onde você for
Oh! Oh! Seu moço!
Mas não me deixe aqui
Enquanto eu sei que tem
Tanta estrela por aí
Andei rezando para
Totens e Jesus
Jamais olhei pro céu
Meu Disco Voador além
Já fui macaco
Em domingos glaciais
Atlantas colossais
Que eu não soube
Como utilizar
E nas mensagens
Que nos chegam sem parar
Ninguém, ninguém pode notar
Estão muito ocupados
Pra pensar
Oh! Oh! Seu Moço!
Do Disco Voador
Me leve com você
Pra onde você for
Oh! Oh! Seu moço!
Mas não me deixe aqui
Enquanto eu sei que tem
Tanta estrela por aí
Enquanto eu sei que tem
Tanta estrela por aí!
Enquanto eu sei que tem
Tanta estrela por aí!
Missa e praia
Céu de anil
Tem sangue no jornal
Bandeiras na Avenida Zil
Lá por detrás da triste
Linda zona sul
Vai tudo muito bem
Formigas que trafegam
Sem porque
E da janela
Desses quartos de pensão
Eu como vetor
Tranquilo eu tento
Uma transmutação
Oh! Oh! Seu moço!
Do Disco Voador
Me leve com você
Pra onde você for
Oh! Oh! Seu moço!
Mas não me deixe aqui
Enquanto eu sei que tem
Tanta estrela por aí
Andei rezando para
Totens e Jesus
Jamais olhei pro céu
Meu Disco Voador além
Já fui macaco
Em domingos glaciais
Atlantas colossais
Que eu não soube
Como utilizar
E nas mensagens
Que nos chegam sem parar
Ninguém, ninguém pode notar
Estão muito ocupados
Pra pensar
Oh! Oh! Seu Moço!
Do Disco Voador
Me leve com você
Pra onde você for
Oh! Oh! Seu moço!
Mas não me deixe aqui
Enquanto eu sei que tem
Tanta estrela por aí
Enquanto eu sei que tem
Tanta estrela por aí!
Enquanto eu sei que tem
Tanta estrela por aí!
Para ouvir a canção, é só dar uma carpidinha aqui, no meu falecido e já semidecomposto MARRETÃO.
4 Comentários
O Raul era genial. Realmente, o Marretão pinçou uma letra bastante refletiva dentre 400 que o Rei do Rock brasileiro compôs. Curto toda obra do Maluco Beleza, mas há uma frase fenomenal da letra eu NASCI HÁ DEZ MIL ANOS ATRÁS: “O soldado que sonhava com a amada numa cama de campanha”... Agora, no romantismo angustiante do que fala Raul há uma de suas composições chamada MEDO DA CHUVA, que além de ser uma das mais belas e poéticas músicas dele, trata da escravidão que pode ser uma VIDA A DOIS quando se tem uma esposa possessiva e ditatorial. “é pena, que você pense que sou seu escravo… dizendo que sou seu marido e não posso partir”…
ResponderExcluirP.S.: - Complementando: “como as pedras IMÓVEIS na praia eu fico ao teu lado, sem saber dos amores que a vida me trouxe e eu NÃO pude viver!!!” ...
Sem dúvida, Guerrilheiro, "Medo da Chuva" é de arrepiar!
ExcluirLonga vida ao falecido! Longa morte ao redivivo! Mesmo que você seja ateu, não há nenhum problema em sair da tumba de vez em quando ou, se preferir, psicografar a si mesmo. Bem vindo ao mundo dos zumbis (e dos vivos também). Assinado: Blogson Crusoe
ResponderExcluirBlogson Crusoe. Rapaz, essa postagem tá mesmo cheia de fantasmas, de almas penadas.
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