Sem Direito De Morrer

Noite dessas, o céu estava iracundo.
O tecido negro de sua raiva rasgado por raios, na horizontal, na vertical, nas diagonais. Grandes talhos a jorrar sangue de elétrons, como que feitos por uma grande navalha. Ou por um poderoso martelo.
Outrora, eu saía semidesnudo na tempestade e me expunha aos seus rigores, largava-me alvo de suas agulhadas. Hoje, não faço mais isso. Não mereço. Portanto, deixei lá a tempestade e fui dormir.
Nem bem adormecido nem bem desperto, naquela fase de modorra, ouvi um barulho na sacada, algum vaso vitimado pelo vento, talvez.
Acendi a luz e lá estava o cara, com a tempestade a lhe fazer fundo, ele, o Thor.
Não o Thor loirinho e barbeadinho da Marvel, que bem podia se prestar a ator de propaganda de xampú e prestobarba, não mesmo.
Era O Thor, o ruivo, de barba de arame farpado, o ogro.
- Como ousaste abandonar a marreta?, ribombou Thor.
Eu nada respondi, até porque havia acabado de me cagar todo.
- Teu blog tinha enorme repercussão em Asgard, até Loki, meu meio-irmão, mais traiçoeiro que uma prostituta troll, muito o apreciava.
- Tá brincando comigo, né?, eu falando com Thor como fosse a mais natural das coisas.
Olhos de cumulus nimbus me atingiram, deixando bem claro que deuses não brincam, e seguiu:
- Somos deuses esquecidos, moribundos... A cada acesso ao teu blog, alguém via lá estampada a minha marreta e lembrava de mim e dos meus, a cada acesso ao teu blog, eu e toda Asgard recebíamos pequenas injeções de poder, a cada acesso, uma taverna voltava a se acender.
Fiquei comovido com a coisa das tavernas.
- Eu nem fazia ideia de que...
- Basta - atalhou-me Thor - reassuma meu martelo, reempunhe Mjolnir.
E tirou do cinto uma réplica menor de seu martelo, o qual empunhava à semelhança de um cajado, o martelo a mim ofertado era mais próximo ao dos quadrinhos, cabo curto. Tomei-o em minha mão esquerda.
- Guarda e honra esse símbolo. És o único, entre os mortais de Midgard, digno de brandir e fazer erguer minha marreta.
Dita dessa maneira, pareceu-me um pouco coisa de viado, mas eu é que não ia dizer isso praquele cara ali, com seus 2,30 m, uns 300 kg (a compleição asgardiana é três vezes mais densa que a humana) e músculos de fiorde.
Agradeci e prometi honrar a marreta.
- Tens aí uma cerveja? - perguntou Thor.
Eu tinha. Abri o litrão, ele pegou e emborcou no gargalo, o litrão parecia uma ampola de injeção na mão do cara.
- Até mais ver, mortal - sentenciou Thor.
E o cara sumiu, teleportou-se pela bifrost, a ponte do arco-íris.
O foda é que ele levou a cerveja junto, era a última.
Espero que ele devolva o "casco" depois.

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