Aos Que Votaram em Lula (31)

"Amigos, Amigos, Criminosos à parte", um editorial de O Estadão

"O governo do presidente Lula da Silva está tentando burlar tratados de Estado para bajular Vladimir Putin. O tirano russo é alvo de um mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes de guerra na Ucrânia, entre eles a deportação forçada de crianças. O Brasil é membro do Tribunal, e se Putin puser os pés em solo nacional, tem de ser imediatamente detido. O País é signatário do documento fundador do TPI, o Estatuto de Roma, que, portanto, está incorporado à Constituição. Mas para Lula esse é só um detalhe inconveniente. Ele já disse que “o conceito de democracia é relativo”, donde se conclui que sua base de sustentação, o Estado de Direito, também deve ser.

O cortejo a Putin não é de hoje. No ano passado, Lula afirmou que, “se eu for presidente do Brasil, e se ele vier ao Brasil, não tem como ele ser preso”. Advertido por algum assessor de que ele não tinha essa discricionariedade, refugou e reconheceu que a decisão caberia à Justiça. Mas aproveitou para tripudiar do TPI: “Eu nem sabia da existência desse tribunal”, acrescentando que iria rever a participação do Brasil.

Sem a carta da ignorância na manga, restou a da má-fé. Em um documento enviado à ONU coalhado de casuísmos, o governo tenta emplacar a tese da imunidade para chefes de Estado. Lula adora se queixar da inoperância da ONU para impor a “paz”, mas quando um órgão com jurisdição ratificada pelo Brasil faz a sua parte, sua reação é acusá-lo de tendências ao exercício “abusivo, arbitrário e politicamente motivado” da jurisdição penal contra representantes de Estado, e propor como remédio a imunidade – quer dizer, a impunidade.

Não é a primeira tramoia para salvaguardar criminosos companheiros. Em 2010, valendo-se de uma decisão esdrúxula do Supremo Tribunal Federal que lavou as mãos ante sua obrigação de extraditar o terrorista Cesare Battisti, condenado pela Justiça italiana por quatro assassinatos, Lula declarou que Battisti era “perseguido político” e lhe conferiu refúgio.

O que rebaixa ainda mais a política externa brasileira nesse tour de force para forjar um salvo-conduto para Putin é que provavelmente o ditador russo nem sequer o usaria. Desde a invasão da Ucrânia, Putin está enfurnado em Moscou. Com exceção de seus suseranos na China e um punhado de ditaduras amigas, não fez mais visitas internacionais. Ele faltou às cúpulas do G-20 na Indonésia e na Índia e foi gentilmente desconvidado a ir à cúpula dos Brics na África do Sul, precisamente porque o país também é membro do TPI.

Se é difícil compreender qual seria o ganho para o Brasil nesse garantismo ad hoc, é porque não há nenhum. É só mais uma manobra da cruzada de Lula contra o “Ocidente”, o “Norte”, o “Grande Capital” ou seja lá como ele chame os “opressores” do “Sul Global”. É só essa doutrina de grêmio estudantil que explica, por exemplo, as contemporizações das atrocidades cometidas por ditaduras esquerdistas na América Latina, ou o endosso ao projeto chinês de transformar o Brics num clube de autocracias antiocidentais, ou o papel que Lula vem protagonizando de uma espécie de porta-voz do Hamas.

O PT chancelou e comemorou a eleição fajuta de Putin. Pouco antes, celebrou um acordo de cooperação com o Partido Comunista chinês e, pouco depois, com o Partido Comunista de Cuba. Pouco importa que Putin seja um ídolo da direita reacionária global, basta que atue como um porrete contra o “imperialismo estadunidense”. Foi o que Lula disse com todas as letras ao canal russo RT, em 2019: “Uma coisa que me deixa orgulhoso é o papel desempenhado por Putin na história mundial, o que significa que o mundo não pode ser tomado como refém pela política dos EUA”.

Para satisfazer o orgulho de Lula, o Itamaraty se tornou refém da política petista ativista e subserviente a potentados autoritários, que nem todo palavrório sobre uma diplomacia “ativa e altiva” consegue disfarçar. Mas sabujice tem limites. Até onde se sabe, ainda há juízes no Brasil. Se Lula insistir em estender o tapete vermelho a mais um déspota criminoso, cabe a eles conduzi-lo à sua cela."

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9 Comentários

  1. Só posso concordar com você.
    Já me decidi : de agora em diante, vou anular todos os meus votos, de vereador a presidente da República.

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  2. Como cantaba Chico Buarque
    Agora já não é normal
    O que dá de malandro regular, profissional
    Malandro com aparato de malandro oficial
    Malandro candidato a malandro federal
    Malandro com retrato na coluna social
    Malandro com contrato, com gravata e capital
    Que nunca se dá mal

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    1. E o próprio Chico, dono de um talento inquestionável, é também um desses malandros, que troca seu apoio por favores políticos.

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    2. A família Buarque de Holanda embolsou mais de 15 milhões só nos primeiros mandados petistas, com Lula. Ao todo, só Deus... Recordo até a ex namorada do Chico embolsou mais de 900 para gravar um CD. Atualmente, sua nova esposa está num cargo público de alto escalão.
      Espero que Putin venha ao Brasil, Lula descumpra o acordo ao qual aderimos e isso nos cause uma invasão por potências estrangeiras. Eu ajudaria as o invasor, aliás. É o que merecemos.

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    3. Eu lembro dessa namorada cantora dele.
      Não imaginei que a coisa chegasse a tal cifra, 15 milhões...

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    4. A família é grande. É fácil chegar a esse valor. Desde Cd para peguete e pecinhas de teatro para a filha e ex mulher, até eventos do genro Carlinhos Brown... E ainda teve irmã Ministra de Estado.
      Lembrando que Gilberto Gil dava a palavra final.

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  3. Temos o poder de voto, mas infelizmente não acredito mais que nosso voto tenha poder.
    O jogo já tá todo comprado, combinado. Creio que o voto seja apenas uma ilusão que nos deem de que participamos de alguma forma do processo democrático.
    E gostaria muito de estar errado.

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