Grimbergen, a Santa Cerveja

A busca pelo Santo Graal? Pela Arca da Aliança? Pelos evangelhos perdidos de Judas e Maria Madalena? Pelo Sagrado Prepúcio do Menino Jesus? Desvendar o terceiro segredo de Fátima? Porra nenhuma!
Que toda essa lenga-lenga religiosa-profética-transcendental-apocalíptica só se presta é a embromar o povão, a manter sempre tementes os leigos nos assuntos do Senhor. Os verdadeiramente iniciados e letrados nos meandros e nas linhas tortas do Criador - sacerdotes e outro clérigos - sabem, e não é de hoje, que há buscas e cruzadas muito mais urgentes e divinas, muito mais caras à causa da humanidade e das suas coisas do espírito.
Há mais de 10 anos, um grupo de quatro monges belgas se dedica a uma messiânica jornada de tradução de fazer corar de vergonha e de inveja o próprio Champollion. Empenham-se em decifrar os apócrifos Manuscritos dos Mar Morto, os devotados monges belgas? Porra nenhuma! Assim como a Inês, o Mar é morto. Já era. Ponto final. Os monges belgas, por suas vezes, bem vivos.
Os abnegados monges conseguiram resgatar, traduzir e reconstituir a receita original da cerveja formulada em 1128 d.C. pelos monges da Abadia de Grimbergen e que, afirmam, foi a precursora de todas as conceituadas cervejas belgas da atualidade.
Os monges, contudo, não trabalharam sozinhos nesta santa tarefa. Tiveram a ajuda de um sem-número de cristãos e desinteressados voluntários, que doaram parte de seu valioso tempo à igreja nesta empreitada arqueológica. Sim, meus caros. Voluntários. Porque se fosse para dar de comer aos que têm fome, para limpar suas chagas e feridas e acolher e agasalhar os seus órfãos, os padres se veriam sem pai nem mãe. Mas para fabricar cerveja, os monges tiveram de distribuir senhas e trabalhar com turnos e escalas. Que o ser humano, verdade incômoda seja dita, só segue os seus próprios desígnios; os de Deus, quando forem coincidentes.
Ainda assim, árduo foi o caminho em busca da cerveja perfeita : “Já tínhamos os livros com as receitas antigas, mas ninguém as conseguia ler. Estava tudo em latim antigo e neerlandês antigo. Então trouxemos voluntários e passámos horas nos livros e descobrimos listas de ingredientes das cervejas produzidas nos séculos passados, os lúpulos usados, o tipo de barris e de garrafas, e até uma lista das cervejas produzidas”, explicou o padre Karel Stautemas.
A cerveja dos monges, que recebeu o mesmo nome do mosteiro, Grimbergen, será produzida e engarrafada em escala industrial pela cervejaria Carlsberg. Porém, para não desagradar aos paladares mais modernos e afrescalhados, não será reproduzida na íntegra de sua receita, sofrerá pequenas modificações : “Não me parece que as pessoas agora gostassem do sabor da cerveja feita na época; a cerveja não tinha grande sabor, era como pão líquido”, explica Marc-Antonie Sochon, perito da Carlsberg responsável pelo fabrico da cerveja medieval. Pão líquido? O meu sem manteiga, por favor.
A cerveja Grimbergen é oferecida em várias versões, a Blonde Belgian, a Rouge, a Ambrée etc. A estrela da abadia, o carro-chefe do mosteiro é a Grimbergen Triple d’Abbaye, com 10,8% de graduação alcoólica e envelhecida por cinco meses em barris de whiskey, à moda do que seja fazia nos anos 1500.
Abaixo, o monge Karel Stautemas, dando uma soberba de uma talagada, com a graça de Deus. Tomando da água que a pomba do Espírito Santo não bebe.

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4 Comentários

  1. Não tenho a menor dúvida de que o monge prefere muito mais a cerveja medieval que o "vinho do padre" (que é misturado com água durante a celebração da santa missa). Inclusive pelo volume ingerido. Prosit!

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    1. Misturado com água benta?
      Isso é o que eu chamo de "batizar" o vinho.

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  2. "Que o ser humano, verdade incômoda seja dita, só segue os seus próprios desígnios; os de Deus, quando forem coincidentes".

    Tá de sacanagem, azarão?
    Rapaz, como vc escreve uma pérola dessa e vez ou outra fica com esse migué de falta de inspiração?

    Quanto às cervejas, das que temos aqui produzidas em larga escala, só tomo as que não me lasquem de dor de cabeça (aqui em Recife fico com a brahma chopp tradicional mesmo) e não acabem de esvaziar meus já combalidos bolsos. Grande abraço e boas férias a você!

    Cássio - Recife/PE.

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    1. Rapaz, essa Grimbergen está na lista das que nunca tomarei, fui dar uma pesquisada e a bicha é caríssima. Também gosto bastante da Brahma tradicional. E de uns tempos para cá, as tais das "puro malte" têm barateado bastante por aqui, vez ou outra, dá pra arriscar uma delas.
      Tem uma que eu não sei se você já provou, ou mesmo se é encontrada aí em Recife, é a Germania 55. Aqui eu a encontro, às vezes, na rede de mercados Assaí. O latão de 710 ml tá saindo por R$ 4,60, o que daria R$ 2,30 por uma latinha de 350 ml. Já falei dela aqui no Marreta, vale a pena dar uma provada:
      https://amarretadoazarao.blogspot.com/2015/10/hoje-eu-vou-de-germania-55.html
      https://amarretadoazarao.blogspot.com/2014/04/cerveja-germania-55-essa-eu-nao-conhecia.html
      Abraço.

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