Pequeno Conto Noturno (88)

Silêncio. Um silêncio de já uns 20, 25, 40 minutos. Um silêncio habitado apenas por respirações, pulsações, batimentos cardíacos e ronronares intestinais involuntários. Um silêncio de pensamentos a andar nas pontas dos pés. Que é das coisas de que Rubens mais gosta com Yrina. A possibilidade desse silêncio.
Rubens sentado, encostado na cabeceira da cama, brincando com os restos de três cubos de gelo na boca, buscando extrair-lhes qualquer rum residual, protelando em ir até a cozinha pegar outra dose, para não desacomodar Yrina, deitada, posição quase fetal, a usar a coxa direita de Rubens como travesseiro, a correr e a riscar as unhas por ela, a enroscá-las em seus pelos. Tanto quanto uma boa dose de rum, Rubens gosta de Yrina a repousar a cabeça em sua coxa, nas cercanias de sua virilha. 
Yrina é quem rompe o silêncio. Levanta a cabeça da coxa de Rubens e sobe até a orelha dele, passa com a boca e o nariz pela barriga, costelas e peito de Rubens, deixa rastros viscosos feito uma lesma preguiçosa e lasciva. Na orelha, dentes mordiscam o lóbulo de Rubens, e uma língua silva e saliva na porta de seu ouvido : 
- Posso ir lá, Rubens? Posso mexer naquele seu lugarzinho, que eu sei que você não deixa nenhuma outra mexer, nenhuma outra pôr os dedos?
Tinham acabado de dar uma boa foda, Rubens e Yrina. Uma bela foda. Nem havia como ter sido diferente. Rubens conhece todos os botões de Yrina a serem apertados - e em que sequência -, todas as alavancas a serem acionadas, todos os fios a serem puxados. E Yrina, há tempos, entregara seu manual de instruções a Rubens, o mapa de Dante de seus Céu e Inferno particulares. Rubens não consegue negar nada a Yrina. Nem quer.
- Posso mexer lá, Rubens, meu bem?
Rubens ri.
- Pode, pode sim, pode devassar meu cômodo mais secreto, meu recôndito mais reservado.
Yrina se põe de pé e, com os grandes e inigualáveis peitos a saltar no ar, vai até o guarda-roupas de Rubens, abre a porta, agacha-se (a Rubens é possível vislumbrar os pentelhos de Yrina pelo vale de suas nádegas) e abre a última de quatro gavetas, a que guarda todos os escritos e manuscritos de Rubens. Todos os seus contos, poemas, crônicas, rascunhos. Yrina lê tudo o que Rubens escreve. E ela, só ela. Mais ninguém.
Yrina pega um amontoado confuso de folhas e volta com elas para a cama. Dá um beijo em Rubens, corre a língua pelos lábios dele, passa-a por entre seus dentes e gengivas. Rubens acaricia os peitões de Yrina.
Rubens deixa Yrina com seus papéis, vai à cozinha e volta. Uma nova dose de rum para ele; uma cerveja long neck para ela.
- Só não vá esperando grandes coisas, acho que já escrevi o que eu tinha para escrever. Acabou.
- Sempre dá pra aproveitar alguma coisa - diz Yrina, e dá um longo gole em sua long neck.
Rubens beija o peito esquerdo de Yrina, brinca com o mamilo dela com a língua, dentro da boca. Rubens não consegue se manter longe daqueles peitões.
- Sai pra lá, velho safado - fala Yrina - deixa eu ler essas suas porcarias aqui.
Rubens volta a se sentar na cama, encostado na cabeceira, entornando o rum e olhando para Yrina a dissecar as suas vísceras expostas em caneta Bic.
Yrina seca a long neck e pede outra a Rubens, que aproveita para recalibrar o seu rum.
- É verdade - começa Yrina -, aqui tem uns 3 ou 4 bons poemas e um conto decente. Mas só isso, bons e decente. Você desenvolveu um estilo, uma técnica, um jogo e um repertório de palavras e associações que garantem que seus contos e poemas sejam sempre bons, não tem como você escrever uma merda muito grande. Quem não te conhece e lê isso aqui, pode até se impressionar, mas quem há tempos sabe de ti, decepciona-se um tanto, vê o quanto seus escritos estão sem força, sem virilidade, até. Parece que escrever virou para você uma coisa meio burocrática, Rubens.
- Pois é, acho a vida imita e contamina a arte.
Os dois dão bons goles em suas respectivas bebidas. Yrina entrelaça sua mão à de Rubens e faz os seus dedos dançarem com os dele; um tango desconjuntado, talvez.
- O que acontece - diz Rubens - é que eu sou um farsante, não tenho um pingo de imaginação. Tudo o que eu escrevo, tudo o que já escrevi até hoje, tem caráter puramente autobiográfico. Só sei escrever sobre o que acontece ou aconteceu comigo. Ou, num laivo máximo de inspiração, como eu gostaria que tivesse acontecido. E não passo daí. Não vou além disso. E, claro, reciclo a maioria das minhas histórias, tento fazer com que pareçam outras. E só. Não tenho muito como escrever algo inédito se não vivo nada novo. Não tenho como surpreender se eu próprio não mais me aventuro e me surpreendo.
- Preguiça de viver coisas novas ou a certeza de que não há mesmo mais nada novo a ser vivido? - pergunta Yrina e acena com a long neck vazia de novo.
- Acho que um pouco das duas coisas - diz Rubens -, a segunda a justificar um pouco a primeira.
Desentrelaça os dedos dos de Yrina, vai à geladeira e volta com outra garrafa para ela.
- E não acha um pouco triste tudo isso? Esse marasmo, esse seu stand-by frente à vida, meio que só esperando a morte chegar? - e Yrina puxa Rubens para perto de si, confundindo, dessa vez, as pernas dela com as dele.
- Acho, até acho triste, sim. Mas mais que triste, possivelmente inevitável, natural, entrópico, eu diria. Penso que depois dos cinquenta, e você logo, logo, chegará a eles, a gente troca a Vida por aquele canal de tv a cabo, o Viva, que só passa reprises e reapresentações de programas antigos. E nos damos conta de que gostamos mais destes do que de qualquer coisa nova que venha sendo feita.
- A Vida pelo Viva... até que é uma boa sacada, mas ainda assim triste pra caralho, derrotista, sei lá...
- Bom, veja o lado bom da coisa - diz Rubens -, se eu não estivesse sintonizado no canal Viva, provavelmente você não estaria aqui neste momento, sentada aqui nesta cama, uma outra, mais novinha e viçosa, estaria no seu lugar a alisar as minhas bolas.
- Velho filho da puta! Então, eu sou só uma novela requentada, né, seu puto?
Rubens gargalha.
- É. Mas das boas. Das antigas. Uma Roque Santeiro. Uma Vale a Pena Foder de Novo.
Yrina puxa Rubens e se beijam. Ela afunda os dedos nas coxas dele, ele apalpa os peitos dela; Yrina avermelha, afogueiam-lhe as faces, o pau de Rubens começa a dar novos sinais de vida.
- Quem sabe eu não possa te dar algo para melhorar essa sua falta de inspiração, esse mais do mesmo dos seus textos? - fala Yrina.
- É?
- É, te dar algo novo em que pensar...
- Novo?
- Não exatamente novo, mas bem pouco usado nos últimos tempos.
- Ah, é?
- É...
Yrina desenrosca suas pernas das de Rubens e se deita de bruços. O rosto virado para os pés da cama e a bunda para Rubens. Pega um travesseiro, coloca sob a barriga e fica com o rabo bem empinado para Rubens. Afasta ligeiramente as pernas.
Rubens sabe que comer aquele cu não o fará escrever nenhum novo grande épico.
Ainda assim, cospe nos dedos e espalha a saliva pelo cuzinho de Yrina, que se contrai ao toque. Espalha por fora e por dentro.
Rubens sabe que comer aquele cu não o fará escrever nenhum outro "Pássaro Azul".
Ainda assim, escarra na palma da mão e lambuza a cabeça do pau com aquele muco.
Rubens sabe que comer aquele cu não o fará escrever sequer um outro "Um Cara Triste".
Ainda assim, Rubens se posiciona no rego de Yrina.
Ainda assim, a monta.

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