Todo Castigo Pra Corno é Pouco (10)

Mais um típico caso do corno que se apaixona por uma dama da noite, por uma mulher da vida. E esse data das antigas, da época das serestas, de quando o compositor tinha que saber escrever e o cantor, cantar. Essa é do insuperável boêmio Adelino Moreira, imortalizada no vozeirão de Nélson Gonçalves; na minha opinião, o Frank Sinatra brasileiro, ou melhor, o Frank Sinatra é que foi o Nélson Gonçalves dos ianques.
Na canção Meu Vício é Você, o corno vai cantando e decantando as "qualidades" da mulher amada. Chama-a de bonceca de trapo, de pedaço da vida (isso é bonito pra caralho), de farrapo de gente que vive só pra pecar, diz que a quer com todos os vícios, embora saiba que o corpo dela seja o prenúncio do mal (quem é que escreve assim hoje?). Declara-se sabedor de que a amada é dada à boemia, à esbórnia, à orgia.
Mas frente às razões do coração que a própria razão desconhece, o corno seresteiro capitula, joga a tolha no ringue do brio e da dignidade : "Aceito seus erros, pecados e vícios, pois, na minha vida, meu vício é você".
É o corno consciente, sabe que os pequenos vícios são perdoados frente aos vícios maiores. E que vício mais capital que o de ser corno? E é também o corno compartilhador, é o corno que sabe que, muitas vezes, é melhor comer doce de leite em dois do que uma lata de bosta sozinho.
Deixo-vos com uma das grandes pérolas (e agora falo sério) do cancioneiro popular.
Meu Vício é Você
(compositor : Adelino Moreira; intérprete : Nélson Gonçalves)
Boneca de trapo, pedaço da vida
Que vive perdida no mundo a rolar
Farrapo de gente que inconsciente
Peca só por prazer, vive para pecar

Boneca, eu te quero com todo pecado
Com todos os vícios, com tudo, afinal
Eu quero esse corpo que a plebe deseja
Embora, ele seja prenúncio do mal

Boneca noturna que gosta da lua
Que é fã das estrelas e adora o luar
Que sai pela noite e amanhece na rua
E há muito não sabe o que é luz solar

Boneca vadia de manha e artifícios
Eu quero para mim seu amor, só porque
Aceito seus erros, pecados e vícios
Pois, na minha vida, meu vício é você.

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2 Comentários

  1. Marreta,
    Você parece ser um dos sujeitos mais viscerais que eu já observei (através de seus textos, lógico). Sua diversão e sina é dar porrada (marretadas, melhor dizendo) em tudo o que te incomoda, em tudo com que você não concorda. Você já elogiou coisas que eu escrevi, mas um comentário emocionado é inesperado e surpreendentemente bom de receber. Isso é que eu quis dizer. Não sei se me fiz entender antes, por isso este comentário (que se não tem nada a ver com o post usado como veículo, tem com o que vou percebendo através das coisas que escreve). É isso.

    Em tempo, não precisa publicar este comentário.

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    1. Grande Blogson, com a sua licença, fiz questão de publicar seu comentário.
      Sua surpresa é compreensível, mas eu não sou o Marreta na vida real, ou melhor, não sou só o Marreta, ele é um personagem, um alterego, se preferir. Também tenho, é claro, um lado mais sentimental, mais vulnerável.
      Marreta também é gente, porra!!!
      abraços

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