Dos Gatos (II) - (Ou : Eclipse Lunar)

Não te vejo mais pelos telhados
Às beiras dos quais nos sentávamos
E descansávamos nossas máscaras,
Nem nas adegas onde nos ensolarávamos,
Nem nas pontes suspensas por sobre os rios poluídos
Onde arremessávamos nossos pecados
E que nos cantavam dolentes canções de ninar.
Não te vejo mais, não te encontro,
Não nos coincidimos.
Éramos os filhos diletos da probabilidade
Hoje, meros dados estatísticos.

Não te vejo mais pelas ruas em que movimento.
Mudaram as vias, as rotas, as mãos, as preferenciais,
Fizeram - e não nos deram -
Um novo mapa-múndi desse labirinto.

Não te voo mais nos ares pelos quais me vento, 
Os fôlegos e as transpirações
Não te têm mais em seus cansaços,
Em seus vapores.
Os escapamentos dos carros, as queimadas
E os cigarros que se jogam fora sem apagar
Não te exalam mais, cremada e carbonizada.
As flores e as lojas de perfumes 
Não ofertam mais amostras grátis de ti.

Não te vejo mais andar 
Pela corda bamba do crepúsculo
Nem saltar de olhos vendados
Do trapézio de cores e de sangue
Que faz o traslado do dia para o breu.
Não te vejo mais castanha pela noite,
Que dizem ser a cor que os gatos aparentam a tais horas.

Estilhacei todos os relógios das paredes,
Atrasei todos os espelhos 
De minha biblioteca de livros não publicados.

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